Conheça Charles, o cão gerente de posto de gasolina em Taguatinga
Abandonado perto do comércio, o cachorro Charles, de raça indefinida, conquistou o coração de frentistas e de clientes, em um posto localizado na QND 60, em Taguatinga Norte
Charles posa com os novos amigos frentistas em frente ao posto de combustível, que virou sua nova moradia – (crédito: Minervino Júnior/CB/D.A.Press)
Oito horas da manhã de segunda-feira, o movimento no Pistão Norte de Taguatinga é intenso. No posto de gasolina da QND 60, perto da Praça do Bicalho, o entra e sai de carros não para. Charles ainda está deitado no seu “escritório”, deve ter tido uma noite longa vigiando o local que funciona 24 horas. Essa é uma das muitas atribuições desse gerente canino. Charles é um autêntico e elegante vira-lata, com idade em torno dos 5 anos.
Sua vida, depois de ser abandonado pelas ruas de Taguatinga Norte, era perambular perto do posto em busca de comida nas lixeiras. Mas, o destino do cão de “raça indefinida” mudou quando foi contratado pelos funcionários do posto.
Carlos Alberto Nunes Silva, operador de bomba, conta a origem do mascote. “Charles ganhou esse nome em homenagem a um funcionário que trabalhava aqui, ele foi demitido, mas deixou um herdeiro” (risos), diz. Entre tantas lendas em torno da chegada do cachorro, Carlos acredita que o bichinho apareceu no posto porque um cliente o deixou próximo ao local, pois ia se mudar para Águas Lindas.
“Aí a gente começou a cuidar do cachorro, nós e os clientes. Tem um deles que vem todo dia deixar comida para o Charles — ele não gosta muito de comer ração, prefere comida de humano. Outro traz roupas para o frio. A casinha dele foi um cliente que doou. Charles é chique”, diz Carlos Alberto.
Gerente do posto, Clayton Rodrigues da Silva divide com Charles a função de relações públicas na freguesia. Além de ser segurança na parte da noite, o cachorro passa o dia circulando entre os carros, criando novas amizades e fidelizando a clientela. “Esse cachorro chegou aqui do nada, encostou num canto do posto e foi fazendo amigos. Ele gosta de interagir com as pessoas. É o primeiro a nos receber quando chegamos ao trabalho, sempre feliz e brincalhão. É claro que a hora do descanso quem define é o próprio Charles, que vive uma vida de rei.
Amigo e companheiro, é assim que os frentistas definem o pet, popular na vizinhança. Outra versão sobre como Charles apareceu foi dada por Danilo Brito, também gerente do posto de combustível. “Eram 11h da manhã, de uma terça-feira, quando um carro parou em frente às bombas de gasolina e a mulher mandou o cão descer. Obediente, ele saiu do veículo e ela foi embora”, garante.
“Trabalho aqui há três anos e nunca tinha visto uma coisa dessas, pensei que a mulher ia abastecer, parou, mandou ele descer e partiu rapidamente, o cachorro ficou olhando, com tristeza, e veio até a gente, começou a se encostar, fazer carinho, grunhindo, foi ficando. É um amigão, nos alegra, cuidamos dele, ele cuida da gente, a noite late bastante se alguém passar por aqui, cuida do frentista da noite, que fica sozinho no local, sozinho não, agora fica com Charles”, conta.
Apesar de mostrar bravura durante a noite, quando Charles vê outro cachorro por perto logo foge, nada de muita coragem. Se assusta também quando ouve barulho de moto, fica dentro da casinha escondido, esperando o barulho cessar, aí, então, sai e começa a brincar de novo, conta às gargalhadas, o grupo de frentistas durante a entrevista.
Danilo afirma que a mulher nunca mais voltou ao posto. Às vezes, o cão é visto, parado, olhando aquele mesmo lugar onde foi abandonado, talvez na esperança de que ela parasse o carro ali de novo, mas isso não aconteceu ao longo desses sete meses. “Ela não voltou e estamos cuidando dele, ao lado dos clientes. Tem casinha, cobertor, coleira nova e come marmita ou ração. Temos um cliente veterinário aqui na rua que cuida do pet, Charles está recebendo todo o cuidado e carinho que merece da nossa comunidade”, ressalta Danilo.
- Quando Valdir Alves chega, Charles está sempre à espera
- Danilo Brito diz que Charles se acostumou com o novo lar
- Deixado nas ruas, o cachorro conseguiu um novo lar
- Charles posa com os novos amigos frentistas em frente ao posto de combustível, que virou sua nova moradia
- Quando Valdir Alves chega, Charles está sempre à espera
Raimundo Alves, trabalha no posto há dois anos e meio e destaca que os dias ficaram muito melhores no posto com a chegada de Charles. “O carinho que esse cachorro transmite aos frentistas e aos clientes é uma coisa de outro mundo, a chegada dele só nos trouxe alegria”, reforça. O frentista Valdir Alves Dias, conhecido como baiano, conta que não consegue mais ficar muito tempo longe do amigão. É ele quem dá banho em Charles e quando está se aproximando do trabalho, o cachorro vai ao seu encontro eufórico. “Tem gente querendo adotar ele, mas não podemos mais viver sem o Charles, é o nosso entusiasmo no dia a dia. Parece um filho para mim e o carinho que ele tem comigo chega a me emocionar, conhece até minha voz. Nos apegamos muito, não sei como alguém consegue abandonar um animal desses. Dócil, inteligente, tudo que a gente manda, ele faz, dá a patinha, senta, deita, brinca demais, é muito feliz aqui, acolhemos ele, é nosso mascote”, descreve.
“Charles, o gerente”, é assim que muitos clientes se referem ao cachorro que até possui um crachá, que exibe com imponência, mas os amigos frentistas, com medo de represálias, acharam melhor tirar o acessório.
Guarda responsável
Para a advogada Ana Paula Vasconcelos, vice-presidente da comissão de direitos dos animais da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-DF), é importante que a sociedade exerça uma guarda responsável sobre o cão que não tem um lar, jogar na rua e deixar em situação de abandono é crime. “A sociedade precisa entender que o cão comunitário traz muitos benefícios, é uma companhia, uma vida, não podemos simplesmente largá-los nas ruas. O governo precisa desenvolver políticas públicas de controle populacional e mapear os animais abandonados. Hoje, não temos como quantificar o número de animais abandonados no DF“, enfatiza.
Gerente de Zoonoses da Secretaria de Saúde do Distrito Federal (SES-DF), Isaías Chianca, alerta sobre cuidados importantes quando a pessoa quiser acolher um cão em situação de abandono, para evitar doenças e também a agressão por parte do animal.
“A população precisa agir com muita cautela. É fundamental levar o animal ao veterinário para saber se ele está saudável ou não. O cão, além de transmitir a raiva, uma doença letal; transmite leptospirose, leishmaniose por intermédio de vetores, mais de 50 tipos de verminoses, dermatites fúngicas ou bacterianas e infecções em geral, podendo algumas se transformar em meningite”, alerta.
De acordo com Isaías, a pasta não possui dados de quantos cães vivem em situação de abandono no DF. “A Zoonoses estima que uma abundante população animal está precisando de adoção”, destaca.
Com informações da Correio Braziliense
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