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As empresas que estão lucrando muito com deportações de imigrantes de Trump

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Para cumprir com sua promessa de promover “a maior deportação em massa” da história americana, o governo Donald Trump precisaria ampliar a capacidade de detenção desses migrantes, o que aumenta os lucros das empresas privadas que administram o sistema

Diferentemente de outros países, onde as prisões são administradas por agências públicas, as penitenciárias e centros de detenção de imigrantes sem documentos nos Estados Unidos são um negócio multimilionário, mantido com a participação de empresas privadas.

A volta do presidente americano Donald Trump à Casa Branca, em 20 de janeiro, e sua promessa de implementação de uma política de deportações em massa fez disparar o valor das ações dos dois gigantes do negócio carcerário: o GEO Group e a CoreCivic.

“O GEO Group foi criado para este momento único da história do nosso país e para as oportunidades que ele irá trazer”, declarou o fundador da empresa, George Zoley, em uma chamada com investidores, dias depois da eleição de Trump para a presidência americana.

Esta é uma “oportunidade sem precedentes”, destacou o presidente e diretor-executivo do maior operador de prisões privadas dos Estados Unidos, que também abriga o maior número de imigrantes no país.

A empresa teve uma receita total de US$ 2,4 bilhões (cerca de R$ 13,5 bilhões) em 2024 e espera dobrar os seus serviços, aumentando sua rentabilidade, durante o segundo mandato de Trump.

Entre seus maiores acionistas, estão os fundos de investimentos BlackRock, Vanguard, Wolf Hill, FMR e Goldman Sachs.

Já a CoreCivic é a segunda maior empresa carcerária do país. Ela atingiu receita de US$ 2 bilhões (cerca de R$ 11,3 bilhões) em 2024 e também projeta uma avalanche de novos negócios com o governo Trump.

“Trabalho há 32 anos na CoreCivic e este, sem dúvida, é um dos períodos mais emocionantes da minha carreira”, declarou em fevereiro o diretor-executivo da empresa, Damon Hininger. Ele prevê que a CoreCivic poderá vir a ter “o crescimento mais significativo da sua história” nos próximos anos.

Alguns dos seus grandes acionistas são o BlackRock e Vanguard, além da River Road e da Cooper Creek Partners.

Estas e outras empresas menores dividem o controle das prisões e centros de detenção de migrantes sem documentos. Elas detêm contratos financiados com fundos públicos, por meio do Serviço de Imigração e Alfândega dos Estados Unidos (ICE, na sigla em inglês), uma agência governamental subordinada ao Departamento de Segurança Nacional americano.

O ICE é o órgão encarregado das deportações de imigrantes. Por isso, ele agora exige que os centros de detenção tenham capacidade suficiente para receber um número cada vez maior de detidos.

Este é o motivo da urgência do governo americano para firmar novos contatos que permitam a reabertura ou construção de novas unidades.

Esta perspectiva fez com que, desde que Donald Trump venceu as eleições presidenciais de novembro passado, o valor das ações do GEO Group disparasse em cerca de 90% – e o da CoreCivic, em cerca de 50%.

Reabertura de centros de detenção

Os acordos entre o governo Trump e as empresas privadas para ampliar a capacidade das unidades existentes estão avançando.

O GEO Group e o governo americano anunciaram em fevereiro a reabertura do centro de detenção Delaney Hall, no Estado de Nova Jersey, com a assinatura de um contrato de 15 anos, no valor de US$ 1 bilhão (cerca de R$ 5,6 bilhões).

Carros estacionados em frente à entrada do centro de detenção Delaney Hall, em Nova Jersey (Estados Unidos)
O centro de detenção Delaney Hall, no Estado americano de Nova Jersey, será reaberto nos próximos meses

Localizado perto de um aeroporto internacional, Delaney Hall será “o primeiro centro de detenção a ser aberto durante o novo governo”, segundo declarou há algumas semanas o então diretor interino do ICE, Caleb Vitello.

O GEO Group espera que este contrato gere mais de US$ 60 milhões (cerca de R$ 338 milhões) de receita durante seu primeiro ano completo de operação. O centro cumpriu com a mesma função entre 2011 e 2017, quando era de propriedade da empresa privada Community Education Centers, adquirida pelo GEO Group em 2017.

Organizações comunitárias protestaram contra a reabertura da unidade e o prefeito da cidade de Newark (onde está localizado do centro de detenção), Ras Baraka, declarou que Delaney Hall “não é bem-vindo”).

“Não queremos fazer parte disso”, afirmou ele, em referência às políticas de deportação do governo americano. Ele defende que elas não respeitam o processo devido a que têm direito as pessoas detidas nos Estados Unidos.

Mas Delaney Hall é apenas um exemplo das diversas unidades que irão reiniciar suas operações nos próximos meses.

Família caminha no centro de detenção de Dilley, no Texas (Estados Unidos)
O centro de detenção de Dilley, no Estado americano do Texas, abrigava famílias durante o primeiro mandato de Donald Trump

No Estado americano do Texas, a empresa privada CoreCivic também assinou, há algumas semanas, um contrato para reabrir o centro de detenção de imigrantes da cidade de Dilley. Anteriormente, este centro abrigava famílias com filhos que haviam sido detidas pelo ICE.

Localizado a cerca de 135 km da cidade de Laredo, na fronteira com o México, o Centro Residencial Familiar do Sul do Texas, em Dilley, espera colocar cerca de 2,4 mil leitos à disposição do governo americano.

Este centro foi utilizado durante o governo do ex-presidente Barack Obama (2009-2017) e o primeiro mandato de Donald Trump (2017-2021). Mas o ex-presidente Joe Biden (2021-2024) eliminou gradualmente a detenção de famílias na unidade, para transformá-la em um centro de detenção de adultos.

A CoreCivic informou que o local foi desativado em 2024, quando seu contrato foi encerrado.

Prevê-se que o centro volte a abrigar famílias sob um novo contrato, segundo o administrador da cidade de Dilley, Henry Arredondo. Ele e o ICE descrevem a unidade como “limpa e organizada”.

“É claro que as pessoas que ficarão ali vivem uma aventura desafiadora, por assim dizer. Mas como sabem, eles precisam ser tratados com dignidade e respeito”, declarou Arredondo à rede de rádio pública dos Estados Unidos NPR.

A meta de atingir 100 mil leitos

Os novos contratos adjudicados nos últimos meses vêm em um momento em que a Casa Branca procura intensificar sua ofensiva contra a migração de pessoas sem documentos.

O governo tem como objetivo deportar, pelo menos na primeira etapa, um milhão dos cerca de 11 milhões de imigrantes sem documentos que vivem nos Estados Unidos.

Mas atingir esta meta não é uma tarefa fácil. Além de aumentar a quantidade de prisões de pessoas sem documentos, é preciso ampliar a capacidade das instalações destinadas a abrigar as pessoas detidas, enquanto esperam o momento da sua expulsão do país.

Presidente americano Donald Trump olha para o lado, sentado na Casa Branca
Para atingir suas metas de deportação de imigrantes, o governo Donald Trump precisaria duplicar a capacidade dos centros de detenção existentes nos Estados Unidos

Para cumprir com os planos do presidente Trump, o “czar da fronteira”, Tom Homan, declarou que irá precisar de pelo menos 100 mil leitos para manter os imigrantes detidos. Este número representa mais do dobro da capacidade atual.

Com este objetivo pela frente, a participação das empresa privadas é fundamental. Mas os novos contratos exigem mais financiamento.

No momento, a Casa Branca deseja fazer com que o Congresso americano, de maioria republicana, aprove um aumento dos recursos necessários para fazer avançar sua política de deportações.

Especialistas calculam que os custos de manutenção de uma pessoa adulta detida somem cerca de US$ 165 (cerca de R$ 929) por dia, por leito.

Dados oficiais indicam que a população de detidos pelo ICE aumentou de 39 mil pessoas, em janeiro, para cerca de 48 mil, no início de abril. Este é o nível mais alto dos últimos cinco anos – muito acima dos 41,5 mil leitos, que é a capacidade máxima permitida atualmente pelos fundos disponíveis para o órgão.

Recentemente, o ICE solicitou permissão para agilizar processos de contratação. A intenção é acelerar os contratos referentes a centros de detenção na Califórnia, Michigan e em outros Estados americanos.

E, há algumas semanas, o governo Trump convidou as empresas privadas a apresentar propostas de ampliação da rede de centros de detenção, transporte, guardas de segurança, assistência médica e outros serviços, no valor de até US$ 45 bilhões (cerca de R$ 253,3 bilhões) para os próximos dois anos.

Em meio às denúncias de superlotação em alguns centros de detenção, a Casa Branca parece enfrentar necessidade urgente de ampliar o número de leitos disponíveis.

Nos últimos meses, o governo americano recorreu a instalações militares como a Estação Naval na baía de Guantánamo, em Cuba. De lá, saiu em março o primeiro voo de venezuelanos deportados para uma prisão de segurança máxima em El Salvador.

Não se sabe se o governo Trump tem planos de continuar empregando aquela unidade ou outras instalações militares com este propósito.

‘Os contratos são muito lucrativos’

O professor de sociologia Brett Burkhardt, da Universidade Estadual de Oregon, nos Estados Unidos, investigou a participação do GEO Group e da CoreCivic no setor carcerário dos Estados Unidos.

Como as duas empresas são cotadas nas bolsas de valores, elas precisam publicar seus resultados e prestar contas aos seus acionistas.

Seus negócios envolvem todo o sistema penitenciário americano e não apenas os centros de detenção de migrantes. Mas este setor passou a representar uma parte substancial da sua receita nos últimos anos.

“Os contratos são muito lucrativos”, declarou Burkhardt à BBC News Mundo, o serviço em espanhol da BBC.

Oficiais verificam documentos de pessoas e famílias
O governo Donald Trump vem intensificando a deportação de imigrantes sem documentos

Atualmente, cerca de 70% de todos os imigrantes detidos se encontram em centros administrados por diferentes empresas privadas. Mas os negócios relacionados aos migrantes não se resumem apenas aos centros de detenção.

As empresas também fornecem serviços de transporte e monitoramento eletrônico dos migrantes, enquanto estão em liberdade, à espera de suas audiências perante o Poder Judiciário.

Burkhardt destaca que existe um certo nível de preocupação com a participação dessas empresas na gestão dos centros de detenção, já que há incentivos para que elas financiem campanhas políticas que promovam medidas migratórias mais rigorosas.

A diretora-executiva da organização Worth Rises, Bianca Tylek, destaca este ponto. Ela é a autora do livro The Prison Industry: How it Works and Who Profits (“A indústria prisional: como funciona e quem se beneficia”, em tradução livre).

“Elas gastaram milhões de dólares, apoiando campanhas políticas que favorecem seus negócios”, declarou ela à BBC.

Tylek também afirma que a rentabilidade das operações dessas empresas depende da manutenção da maior quantidade possível de pessoas detidas, reduzindo ao máximo os custos dos serviços oferecidos.

Esta lógica está presente em todo o sistema carcerário norte-americano. Mas, nos centros de detenção de imigrantes, a situação é mais preocupante, segundo ela, porque estas pessoas “têm menos direitos e podem sofrer mais abusos”.

A redução de custos faz com que as pessoas detidas vivam em condições abaixo dos padrões mínimos que deveriam ser oferecidos pelos centros de pessoas sem documentos, segundo a diretora de promoções da organização Detention Watch Network, Setareh Ghandehari.

Existem denúncias, já há algum tempo, sobre as condições de vida precárias das pessoas detidas naqueles centros.

Ghandehari declarou que, muitas vezes, os migrantes não têm acesso aos serviços médicos necessários. Além disso, segundo ela, as unidades não recebem manutenção e os banheiros e as condições de higiene estão longe de serem aceitáveis.

“Observamos abusos em vários centros de detenção”, destaca Ghandehari.

‘Somos supervisionados pelo governo’

Um porta-voz do GEO Group declarou à BBC que, ao longo das últimas quatro décadas, a empresa trabalhou com sete governos americanos.

Em todos os casos, “nossos serviços contratados são supervisionados pelo governo federal”, para garantir o rigoroso cumprimento dos padrões nacionais de detenção, aplicáveis a todos os centros do ICE.

Pessoa com as mãos algemadas
As empresas GEO Group e CoreCivic afirmam que o governo americano supervisiona constantemente seus centros de detenção

Os serviços prestados “incluem acesso a assistência médica 24 horas em certas unidades em que a GEO presta diretamente serviços médicos, segurança, manutenção e serviços de alimentação, bem como acesso a serviços recreativos e assessoria jurídica”, destacou o porta-voz.

A empresa também indica que, nas unidades em que ela oferece serviços de assistência médica, as pessoas detidas têm acesso a uma equipe de profissionais, formada por médicos, enfermeiros, dentistas, psicólogos e psiquiatras, bem como acesso a serviços externos, em caso de necessidade.

Já a empresa CoreCivic declarou à BBC que sua reponsabilidade é “atender a cada pessoa com respeito e humanidade, enquanto ela recebe o processo legal devido a que tem direito”.

“Temos o firme compromisso de oferecer assistência de alta qualidade às pessoas em nossas instalações”, declarou o diretor de Assuntos Públicos da empresa, Ryan Gustin.

“Nossas unidades estão sujeitas a diversos níveis de supervisão e são monitoradas com muito rigor pelos nossos sócios governamentais, para garantir o pleno cumprimento das políticas e procedimentos”, declarou ele.

Por outro lado, a empresa afirmou estar comprometida com os direitos humanos das pessoas detidas, “incluindo direitos legais, segurança, assistência médica, visitas e qualidade de vida”.

A BBC News Mundo entrou em contato com o ICE, mas não recebeu resposta até a publicação desta reportagem.

Uma análise dos registros de inspeção de 17 centros do ICE entre os anos fiscais de 2020 e 2023, realizada por um organismo de controle federal, encontrou evidências de assistência médica deficiente em mais da metade das instalações e violações das normas de saúde e segurança ambiental em mais de um terço delas, segundo informou o jornal The Washington Post.

No momento, o que está claro é que, para implementar sua ambiciosa política de deportações, o governo Trump precisa conseguir o financiamento necessário para aumentar o número de prisões de imigrantes sem documentos e contar com unidades em quantidade suficiente para abrigá-los.

Esta é uma batalha entre a Casa Branca e o Congresso americano que provavelmente irá ocorrer nos próximos meses, para cumprir com a promessa eleitoral de Donald Trump, de levar a cabo “a maior deportação” de imigrantes da história dos Estados Unidos.

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Escrito por
Jeová Rodrigues

Jornalista

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