Samu: heróis e heroínas de um cotidiano desafiador
Em 2022, o serviço atendeu cerca de 174 missões diárias, mesmo com gargalos que impactam nos atendimentos, como falta de equipamentos e de recursos humanos. Solicitações não atendidas aumentaram nos últimos três anos
Entre os cerca de 800 servidores do Samu no DF, Talita Rafael, Victor Queiroz e Vanessa Rocha integram equipe que tem amor por salvar vidas – (crédito: Fotos: Kayo Magalhaes)
Em atuação no Distrito Federal desde 2005, o Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (Samu) conta com cerca de 800 servidores no DF, para atender uma população de quase 3 milhões de habitantes. Apesar da quantidade de profissionais ser percentualmente superior à recomendada pelo Ministério da Saúde, o número de solicitações sem atendimento cresceu 33,6% em 2022 comparado com 2021 (veja quadro). A falta de recursos humanos e de equipamentos está entre os maiores gargalos que levam a esse cenário.
A rotina, além de exaustiva, é afetada por outros fatores que não a atividade fim. Por exemplo, a frota do Samu precisa ser trocada pelo Ministério da Saúde após cinco anos de uso. A manutenção, no entanto, deve ser realizada com mais frequência e também pode desfalcar a quantidade de viaturas disponíveis.
Nos últimos três anos, a burocracia na troca de contrato com fornecedores dos automóveis também impactaram no crescimento de demandas sem atendimento. Em 2022, por exemplo, o processo de substituição atrasou a entrega de viaturas. “Em casos de urgência e emergência, o veículo tem desgaste muito intenso. Recebemos viaturas novas em novembro de 2022. Semanas depois, já estavam na oficina. Nos últimos anos, o mercado automobilístico sofreu muito. As oficinas não tinham peça. Muitos carros começaram a ficar parados sem reparos”, explica o diretor do Samu-DF, Victor Queiroz.
Outro desafio enfrentado pelo Samu é quando um socorro termina no hospital e a unidade de saúde retém a maca até que abra um leito para o paciente. Diante do problema, os profissionais do serviço fizeram um relatório para monitorar as macas retidas. O documento foi enviado à Promotoria de Justiça de Defesa da Saúde (Prosus), que propôs uma ação civil pública e fixou multa para cada maca retida por mais de seis horas, o que diminuiu a quantidade de equipamentos parados nos hospitais, representando um avanço para o Samu, apesar do problema ainda comprometer o atendimento ao usuário.
Mesmo com todos os problemas, somente em 2022, o serviço cumpriu uma média de 174 missões por dia. Ao todo, o SAMU DF conta com 49 equipes móveis de intervenção, incluindo Unidades de Suporte Básico (USB), motolâncias, Unidades de Suporte Avançado (USA) e até mesmo uma Unidade de Suporte Avançado Aeromédico (helicóptero).
Humanização
Em 2023, o Samu-DF completa 18 anos. Os servidores, que trabalham em plantões de seis horas, 12 horas e 18 horas, acabam vivenciando momentos inusitados, engraçados e, principalmente, emocionantes. A enfermeira Vanessa Rocha compartilhou uma história curiosa que vivenciou em um atendimento. “Uma mulher ligou solicitando ajuda para o marido, informando que ele estava passando mal e não respondia. A solicitação acabou entrando como parada cardiorrespiratória. A equipe saiu correndo para atender. Chegamos lá e ele estava sentado na cama. De fato, ele não estava se sentindo bem, pois era hipertenso, mas o motivo de não estar respondendo a esposa era porque ele estava chateado com ela e não queria dirigir a palavra à mulher e não porque estava inconsciente”, conta.
O Samu no DF é 100% financiado com verbas federais. Hierarquicamente, o serviço é subordinado à Secretaria de Saúde do DF. Tecnicamente, é subordinado ao Ministério da Saúde. É o governo federal que determina o dimensionamento mínimo, a configuração da central de regulação, as exigências a serem assumidas. Para o exercício de 2023, foi estabelecido para o Distrito Federal o custeio das ações no montante de R$ 15.377.472,00.
Fluxo
No processo de atendimento de demandas recebidas pelo Samu, há um fluxo administrativo que envolve procedimentos administrativos e reguladores, imprescindíveis para o bom atendimento. Quando o serviço recebe um chamado, a ligação é atendida por um telefonista e filtrada por um médico regulador, que avalia o caso e dá um encaminhamento ou uma orientação. “Sem a central de regulação, o volume completo de informações que entram podem impactar a rua. O custo operacional da central, das viaturas, recursos humanos, equipamentos, insumos, frotas. O serviço como um todo é muito robusto. Não existimos para fazer só um transporte ao hospital, nós fazemos intervenções”, destaca o diretor do Samu.
Quando o tema é recurso humano, as estratégias e políticas de renovação de pessoal também impactam no bom fluxo de atendimento das demandas recebidas pelo Samu. “Atividades de urgência e emergência têm um desgaste psíquico enorme. Estatísticas mundiais que analisam os profissionais que trabalham na linha de frente de serviço de urgência mostram que esse profissional dificilmente passa mais do que 15 anos na função. Tudo impacta diretamente o atendimento. Desde o farmacêutico que trabalha na central, passando pelo atendimento do telefonista, até o médico regulador e o agente que atua na linha de frente”, ressalta Queiroz.
Emoção
Portaria Conjunta n°40/2018, criou o Serviço Unificado de Atendimento Pré-Hospitalar (Suaph) entre o Samu e o Corpo de Bombeiros Militar do Distrito Federal (CBMDF) para os atendimentos de urgência e emergência. “Um militar do Corpo de Bombeiros integra a equipe de regulação do Samu 24 horas por dia para ajudar a reduzir duplicidade em atendimentos e organizar as missões em conjunto”, esclarece o diretor Victor Queiroz. “Atualmente, quando há demandas sem atendimento, o Samu pede apoio ao CBMDF ou orienta o paciente a ir a uma unidade de atendimento por meios próprios”, acrescenta Queiroz.
Idealizado pelo serviço móvel em 2007, o projeto Samuzinho tem o objetivo de conscientizar estudantes de escolas públicas e privadas sobre a relevância da assistência emergencial, utilizando métodos lúdicos e interativos. O movimento auxilia ainda a reduzir a ocorrência de trotes e instruir os alunos sobre as ações necessárias para socorrer alguém em risco até a chegada da ambulância.
Mesmo com todas as dificuldades e uma rotina exaustiva, o dia a dia produz histórias que os profissionais levam para a vida toda. A técnica de enfermagem Talita Rafael contou sobre a emoção de ver uma mãe entregando a filha de um ano em seus braços após um afogamento. “A criança havia caído na piscina. É muita responsabilidade. Lembro até hoje da mãe me entregando a filha. A confiança nos olhos dela. É muito forte isso. Precisamos ter equilíbrio emocional, a ação rápida, deixar a mãe confiante e, quando envolve criança, a comoção é muito grande”, afirma.
“Para nós que trabalhamos com isso diariamente, aquele é mais um atendimento, mas se você é o solicitante, pode ser o pior momento da sua vida. Quando você entra naquela situação e salva alguém, você transforma vidas. Já tivemos casos de servidor do Samu que cantou para o paciente para confortá-la em um momento de dificuldade e necessidade emocional. Tem parente de paciente que me encontra nas redes sociais e me manda mensagem agradecendo”, conta o diretor, Victor Queiroz. “Lembro até hoje de um atendimento que fiz. Era um caso de parada cardiorrespiratória de alta gravidade. Muitas vezes, atendemos pacientes que estão no final da vida. Neste caso, não conseguimos reverter a parada e ela veio a óbito. O marido da vítima estava no local, sob forte emoção. Apesar do momento difícil, ele me agradeceu. Eu não esperava essa reação. Mas, a maneira como conduzimos a situação, deixou o paciente grato e trouxe conforto naquele momento”, compartilha.
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