Financiamento para combater aquecimento global é tema central na COP29
No ano mais quente da história, conferência climática no Azerbaijão começa com a difícil tarefa de definir novos recursos que possibilitem aos países em desenvolvimento investirem em ações voltadas à redução do efeito estufa
Ainda sob o impacto do fracasso da Conferência da Biodiversidade, suspensa na semana passada pela falta de acordo entre as partes, delegados de 197 países e da União Europeia chegam a Baku, no Azerbaijão, com a difícil missão de salvar as metas do Acordo de Paris. No ano mais quente já registrado pela ciência, essa está sendo chamada de “COP do financiamento”, porque há urgência de se redefinir como os países industrializados levantarão fundos que garantam, às nações em desenvolvimento, a adoção de medidas drásticas para enfrentar o aquecimento do planeta.
Nos últimos meses, agências da Organização das Nações Unidas (ONU) e de institutos meteorológicos têm estrategicamente divulgado estudos que colocam a Terra no caminho do apocalipse, segundo as palavras do secretário-geral da organização, António Guterres. Sem aumentar a ambição das contribuições de cada país signatário, os termômetros registrarão entre 2,6°C e 3,1°C a mais até 2100, comparado ao século 19. Os relatórios científicos atestam que uma elevação tão significativa provocará um colapso dos sistemas terrestres. Porém, sem dinheiro, não é possível falar em mais comprometimento.
Fundo
Em 2015, no histórico Acordo de Paris, os signatários do documento concordaram que as nações industrializadas, principais responsáveis pelo lançamento expressivo de gases de efeito estufa, dedicariam US$ 100 bilhões anuais a um fundo compensatório. O dinheiro ajudaria os países pobres e em desenvolvimento a mitigar os danos já causados pelo CO2 na atmosfera, além de se adaptarem a tragédias climáticas inevitáveis, como enchentes, secas e aumento do nível do mar. Esse valor nunca foi atingido, e o tema é o que mais tranca a pauta das negociações.
O mesmo acordo previu que, em 2024, seria adotado o Objetivo Coletivo Quantificado para o Financiamento Climático (NCQG), para substituir os US$ 100 bilhões anuais. O instrumento visa canalizar para os países em desenvolvimento fundos para ações climáticas, assim como incentivar soluções de baixo carbono e tecnologias mais sustentáveis em setores como energético, transportes e agricultura.
Para os países apresentarem seus novos planos climáticos nacionais, em fevereiro, é preciso que o NCQG seja adotado ainda em Baku, pois as ações dependerão de quanto dinheiro estará disponível em caixa. Para se ter ideia do tamanho do que está sendo negociado, um levantamento do Grupo Independente de Peritos de Alto Nível sobre Financiamento Climático (IHLEG) estima que os países em desenvolvimento precisam de US$ 2,4 bilhões por ano até 2030 para cumprir suas metas — isso é quatro vezes o valor investido atualmente. A avaliação de especialistas e organizações que monitoram as tomadas de decisões globais é que o ritmo das negociações está lento demais para que a COP29 se encerre com a questão dos NCQGs resolvida.
Fósseis
Se os investimentos em mitigação e adaptação são cruciais para manter as metas de 2015, salvar o Acordo de Paris significa, principalmente, substituir os combustíveis fósseis por fontes limpas. Embora a capacidade energética sustentável esteja aumentando globalmente, as COPs não foram suficientemente ambiciosas em suas pautas, avalia Ana Missirliu, da organização NewClimate Institute. “O Azerbaijão não inclui uma transição dos combustíveis fósseis na sua contribuição nacional ou na agenda da COP29. Esse não é o tipo de liderança de que necessitamos em um momento crucial da ação climática”, avalia.
Bill Hare, da Climate Analytics, acredita que a União Europeia continuará insistindo no gás natural, outro importante contribuinte do efeito estufa. “Embora o Azerbaijão tenha um enorme recurso renovável, que poderia ser utilizado para criar hidrogênio verde para exportar, a fome da Europa por gás fóssil parece estar comandando o espectáculo”, diz.
Somada à falta de um texto mais assertivo sobre a substituição energética está a preocupação com a eleição de Donald Trump para a Presidência dos Estados Unidos, o maior emissor de gases de efeito estufa. O político já deixou claro que fará o mesmo que em 2017, quando assumiu o primeiro mandato: sairá do Acordo de Paris. Embora haja um entendimento de que o magnata não conseguirá rasgar um documento forjado por 197 países e pela União Europeia, é preocupante que um dos slogans de sua campanha tenha se referido à intenção de aumentar a exploração de petróleo.
“A eleição de um negacionista do clima para a Presidência dos Estados Unidos é extremamente perigosa para o mundo”, avalia Bill Hare, cientista climático e diretor da Climate Analytics. “Nós já estamos assistindo a danos extremos, perda de vidas em todo o planeta devido ao aquecimento de 1,3ºC induzido pelo homem”, diz. Segundo o Instituto Copérnico, da União Europeia, 2024 ultrapassará 1,5ºC. “O presidente Trump não está acima das leis da física e o país que ele lidera também não”, avalia.
Para Hare, ex-autor do Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas, porém, Trump não é maior que o Acordo de Paris. “Já passamos por isso antes, e a retirada dos EUA não colapsou o acordo.”
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