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Fundo de Apoio à Cultura: o que está em jogo no DF

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O Fundo de Apoio à Cultura (FAC), principal instrumento de fomento e incentivo às atividades artísticas desenvolvidas no Distrito Federal desde 1991, tem sido o principal motivo de embate do movimento cultural de Brasília com o governo de Ibaneis Rocha (MDB).

Neste sábado (11), a Secretaria de Cultura anunciou o cancelamento do edital “Áreas Culturais” de 2018, que previa investimento de R$ 25 milhões a até 269 projetos. A decisão ainda precisa ser publicada no Diário Oficial do DF, mas deixou os agentes culturais ainda mais apreensivos.

A ideia é destinar a verba à reforma do Teatro Nacional para entregar, no aniversário de 60 anos de Brasília, a sala Martins Penna. Para isso, a pasta pretende abrir uma nova linha de editais, voltada para a revitalização de equipamentos culturais.

Teatro Nacional de Brasília — Foto: Marcelo Brandt/G1Teatro Nacional de Brasília — Foto: Marcelo Brandt/G1

De um lado, representantes do cinema, do teatro, da música, da dança e das artes visuais afirmam que o FAC está “sob ameaça” e que o GDF descumpre a Lei Orgânica da Cultura (LOC), que regulamenta o fundo. Segundo eles, o remanejamento da verba para outras finalidades é ilegal.

Nesta sexta (10), pelo segundo dia consecutivo, houve protesto. Em frente ao Buriti, um grupo de pessoas vestidas de preto simularam a “morte” da cultura.

Representantes da cultura fazem protesto em frente ao Palácio do Buriti, em Brasília, pela manutenção do Fundo de Apoio à Cultura (FAC) — Foto: Clarice Cardell/Arquivo pessoalRepresentantes da cultura fazem protesto em frente ao Palácio do Buriti, em Brasília, pela manutenção do Fundo de Apoio à Cultura (FAC) — Foto: Clarice Cardell/Arquivo pessoal

Por outro lado, a Secretaria de Cultura – responsável pela gestão e destinação dos recursos do FAC – garante respeitar a legislação e nega a possibilidade de risco à manutenção programa. O primeiro edital do ano, o “FAC Ocupação” prevê investimento de R$ 7, 7 milhões.

Até esta sexta (10), a secretaria cogitava cancelar, também, o edital “Audiovisual” de 2018, mas voltou atrás. Com isso, os 95 projetos aprovados receberão, juntos, R$ 27 milhões – sendo R$ 12,2 milhões do FAC e 14,8 milhões do Fundo Setorial do Audiovisual. O processo está na etapa de análise de recursos do resultado preliminar.

Para entender o que está em jogo nesta disputa de narrativas, o G1 conversou com agentes culturais, representantes do governo e deputados distritais envolvidos com a questão.

Do FAC para o Teatro Nacional

Teatro Nacional - Brasília (DF) #Obras_Niemeyer — Foto: Marcelo Brandt/G1Teatro Nacional – Brasília (DF) #Obras_Niemeyer — Foto: Marcelo Brandt/G1

Com orçamento de 2019 previsto em R$ 65,3 milhões, a Secretaria de Cultura do Distrito Federal afirmava que os recursos do FAC estavam comprometidos pelo pagamento dos editais de 2018 que não haviam sido quitados (veja na tabela abaixo).

A previsão de caixa, porém, era mais alta que os valores anuais investidos desde 2012. A primeira medida adotada pela secretaria para contornar as dívidas foi suspender os dois editais de 2018. Juntos, eles previam repasses de R$ 37,2 milhões para o financiamento de até 364 projetos.

Agora, com o cancelamento do “FAC Áreas Culturais”, restam R$ 12 milhões de débito para pagar.

Tabela orçamentária da Secretaria de Cultura para 2019 — Foto: ReproduçãoTabela orçamentária da Secretaria de Cultura para 2019 — Foto: Reprodução

A Secretaria de Cultura argumentou que havia possíveis inconsistências jurídicas na execução dos editais e que, por isso, eles foram submetidos à análise da Assessoria Jurídico-Legislativa. A pasta não esclareceu por que apenas um deles acabou anulado.

O principal argumento para a suspensão era de que os projetos haviam sido lançados pela gestão passada sem que houvesse dinheiro em caixa, com uma previsão do que seria o orçamento de 2019.

A prática ocorre, pelo menos, desde 2013 (entenda abaixo) e era considerada, pela atual gestão, como uma das alternativas para lançar o bloco de editais do segundo semestre deste ano.

Manifestantes interditam via S1 em protesto contra mudanças no Fundo de Apoio à Cultura (FAC) — Foto: Luiza Garonce/G1Manifestantes interditam via S1 em protesto contra mudanças no Fundo de Apoio à Cultura (FAC) — Foto: Luiza Garonce/G1

Agentes da cultura estimam que o cancelamento do edital possa afetar até 30 mil pessoas, envolvidas direta ou indiretamente nos projetos.

O líder cultural e maestro Rênio Quintas disse ao G1 que recebe a notícia com “a maior indignação possível”. Segundo ele, a anulação do investimento em projetos de diversas áreas da cultura representa uma” violência”.

“É uma violência, porque existe todo um tecido fragilizado por essa crise. Os projetos aprovados já haviam começado a ser produzidos, afinal, há quase 20 anos o FAC funciona assim. Isso nunca aconteceu.”

O maestro Rênio Quintas durante protesto no DF pela garantia e manutenção do Fundo de Apoio à Cultura (FAC) — Foto: Luiza Garonce/G1O maestro Rênio Quintas durante protesto no DF pela garantia e manutenção do Fundo de Apoio à Cultura (FAC) — Foto: Luiza Garonce/G1

O maestro também destaca a falta de diálogo do secretário Adão Cândido. “Ele nunca foi em uma audiência pública, sempre teve medo e mandou assessores. E em nenhuma delas foi dito que ele pegaria o dinheiro do FAC para fazer obra.”

“O FAC não é orçamento da Secretaria de Cultura. A verba do FAC, como qualquer fundo, tem finalidade, e a finalidade do FAC são projetos de fomento e não de reforma. Estão buscando brecha jurídica. “

Mesmo assim, Rênio Quintas acredita que será possível reverter a decisão na Justiça. “Todos os ministérios que consultamos foram unânimes em dizer que não se pode usar o recurso do FAC que não seja para fomento de projetos culturais. A ilegalidade é flagrante.”

“Vamos às últimas consequências na Justiça.”

Por meio de nota, a Secretaria de Cultural informou que a decisão está de acordo com as prioridades do governo de Ibaneis Rocha (MDB), de “desenvolver uma política pública efetiva em prol do patrimônio cultural”.

Adão Cândido, secretário de Cultura do DF — Foto: TV Globo/ReproduçãoAdão Cândido, secretário de Cultura do DF — Foto: TV Globo/Reprodução

A pasta afirma, ainda, que considera “fundamental” contemplar as diversas áreas da cultura “dentro das iniciativas de fomento, garantindo investimentos em todos os setores”.

“Nossa meta é construir planos para garantir conservação e manutenção dos espaços, bem como a qualidade do conteúdo de cada um”, afirma o secretário, Adão Cândido, na nota.

Teatro Nacional de Brasília — Foto: G1
Teatro Nacional de Brasília — Foto: G1

Com a anulação do “FAC Áreas Culturais”, a verba que seria destinada aos projetos será realocada em uma nova linha que, segundo o governo, prevê realização de projetos de infraestrutura cultural, patrimônio material e imaterial, cultural, histórico e artístico, museus, arquivos e demais acervos.

O primeiro objeto de interesse do edital será a sala Martins Penna, inaugurada em 1966 com capacidade para 407 lugares.

Realocação de recursos

Lei Orgânica da Cultura (LOC) do Distrito Federal — Foto: LOC/ReproduçãoLei Orgânica da Cultura (LOC) do Distrito Federal — Foto: LOC/Reprodução

Pela Lei Orgânica da Cultura, que regulamenta o FAC, a receita do fundo só pode ser aplicada em projetos que estejam de acordo com a sua finalidade: “apoiar, facilitar, promover, difundir e fomentar projetos e atividades culturais, em modalidade reembolsável ou não reembolsável”.

Despesas de manutenção administrativa da Secretaria de Cultura não podem ser custeadas com os recursos do FAC, exceto se estas despesas estiverem diretamente ligadas ao “funcionamento eficiente” do programa.

Neste caso, a norma permite que até 5% da verba seja aplicada em “manutenção, informatização, contratação de consultoria, contratação de pareceres, contratação de serviços auxiliares, remuneração de colegiados e profissionais responsáveis pela análise de propostas, acompanhamento, fiscalização e análise final de prestação de contas, aquisição de ferramentas de gestão, aquisição de equipamentos e outros bens e serviços”.

Empresa especializada em manutenção predial foi contratada por 4.529.999 pela Secretaria de Cultura do DF — Foto: Agência Brasília/Pedro VenturaEmpresa especializada em manutenção predial foi contratada por 4.529.999 pela Secretaria de Cultura do DF — Foto: Agência Brasília/Pedro Ventura

Mesmo assim, deputados distritais entrevistados pelo G1, acreditam que realocação dos recursos dos editais de 2018 para a reforma do Teatro Nacional pode gerar um imbróglio jurídico, para além dos efeitos econômicos e políticos.

Uma proposta apresentada à Secretaria de Cultura para solucionar a questão seria manter os editais como previsto no cronograma e destinar cerca de R$ 40 milhões ao Teatro Nacional via emendas de bancada de deputados federais e senadores.

Os prazos

Pela Lei Orgânica da Cultura (LOC), o GDF deve respeitar o seguinte calendário de publicação de editais e de verba disponível:

  • Até 31 de janeiro, é publicado o saldo do exercício anterior
  • Até 30 de abril, é lançado o primeiro bloco de editais, contendo todo o saldo do exercício anterior adicionado da metade da previsão orçamentária do exercício em curso, incluindo-se o disposto no art. 66, II
  • Até 31 de agosto, é lançado o segundo bloco de editais, com todo o saldo restante do em curso, incluindo-se o disposto no art. 66, II

O que dispõe o artigo 66, inciso II é que 0,3% da receita corrente líquida do Distrito Federal vai para o caixa do FAC.

Superávit de 2018

Calculadora sobre uma mesa — Foto: TV Globo / ReproduçãoCalculadora sobre uma mesa — Foto: TV Globo / Reprodução

O superávit de 2018 ainda não foi publicado, porque depende de oficialização da Secretaria de Fazenda, responsável por armazenar o saldo. O valor estimado, porém, é conhecido: R$ 2,6 milhões. Em 2017, o superávit foi de R$ 33,5 milhões.

Nesta quarta (9), após o protesto que reuniu representantes da cultura em frente à Biblioteca Nacional de Brasília, o secretário-executivo Cristiano Vasconcelos disse ao G1 que o valor deve ser divulgado na próxima segunda (13).

No mesmo dia, a Assessoria Jurídico-Legislativa da Secretaria de Cultura vai emitir parecer sobre a manutenção ou o cancelamento dos editais remanescentes de 2018. O que pode afetar diretamente o valor do superávit.

Editais 2019

publicação do primeiro edital de 2019 ocorreu dentro do prazo definido pela LOC, em 30 de abril. No entanto, ao contrário do que determina a lei, apenas um deles foi contemplado, o “FAC Ocupação”.

Para este, a Secretaria de Cultura prevê um investimento total de R$7,7 milhões. A pasta argumenta que não é possível estimar a verba destinada aos demais editais – e tampouco as datas de abertura dos processos – enquanto a Secretaria de Fazenda não publicar o superávit de 2018.

Pagamentos do FAC

Agentes da cultura fazem protesto no DF pela garantia e manutenção do Fundo de Apoio à Cultura (FAC) — Foto: Luiza Garonce/G1Agentes da cultura fazem protesto no DF pela garantia e manutenção do Fundo de Apoio à Cultura (FAC) — Foto: Luiza Garonce/G1

Não é da gestão atual que os pagamentos do FAC são feitos como cheques pré-datados. Alguns editais são lançados para, somente no ano seguinte, os projetos aprovados começarem a receber a verba.

Na prática, isso significa que boa parte do dinheiro não vem do caixa do ano em que o edital foi lançado, mas conta com uma previsão do orçamento do ano seguinte – a Lei Orçamentária Anual é esboçada no meio do ano e aprovada em dezembro.

Fonte: G1.

Ao final do ano, após serem executados os valores, o montante que sobra – o superávit do FAC – é encaminhado para a Secretaria da Fazenda, responsável por acumular e destinar a verba, que pode voltar para a Cultura ou ser encaminhada para outras finalidades.

Segundo a Lei Orgânica da Cultura (LOC), o valor deve ser divulgado pela Secretaria de Cultura até 31 de janeiro do ano seguinte (entenda acima).

Até a publicação desta reportagem, o governo não havia divulgado o superávit de 2018 e tampouco informado a destinação da verba – em quê ela foi aplicada ou se ainda está retida.

Jornalista

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