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Após sete meses, CPI das Bets termina em fiasco e sem relatório

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O documento pedia indiciamento de 16 pessoas, incluindo Virgínia Fonseca, Deolane Bezerra e Rico Melquiades. CPI também expôs impacto das apostas no orçamento das famílias brasileiras

Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) das Apostas Esportivas, conhecida como CPI das Bets, encerrou os trabalhos nesta quinta-feira (12) com a rejeição do relatório final elaborado pela senadora Soraya Thronicke (Podemos-MS). Foram quatro votos contrários e três favoráveis. É a primeira vez, em uma década, que uma CPI do Senado termina sem aprovação do relatório final e, portanto, sem adoção de medidas como encaminhamento de indiciamentos ou propostas legislativas pelo colegiado.

O relatório sugeria o indiciamento de 16 pessoas, incluindo empresários, operadores de plataformas de apostas e influenciadores digitais como Virgínia Fonseca, Deolane Bezerra e Rico Melquiades. Também trazia 20 propostas legislativas para endurecer a regulação do setor, como a proibição de jogos semelhantes a caça-níqueis e a restrição de apostas para beneficiários do CadÚnico, além de regras mais rígidas para publicidade e operação das empresas.

Apesar da rejeição, Soraya anunciou que entregará o relatório e seus documentos às autoridades, incluindo o diretor-geral da Polícia Federal, Andrei Rodrigues, o procurador-geral da República, Paulo Gonet, e o presidente do Supremo Tribunal Federal, ministro Luís Roberto Barroso, além do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. “Saio feliz, com missão cumprida. Não terminará em pizza, eu não sou pizzaiola”, afirmou.

Oitiva marcada por embates e constrangimentos

Durante as oitivas, os depoimentos de influenciadores geraram grande repercussão pública e até episódios inusitados. A influenciadora Virgínia Fonseca, que depôs em maio, negou qualquer prática ilegal ao divulgar casas de apostas e afirmou que sempre agiu dentro da legislação vigente. Ela declarou que não se considerava responsável por eventuais prejuízos de apostadores, mas reconheceu que não tinha pleno conhecimento das regras do setor. Ainda assim, seu nome foi incluído no relatório, acusada de estelionato e propaganda enganosa.

Chamou atenção o comportamento de alguns senadores, que, apesar do tom crítico nas perguntas, pediram fotos e selfies com os influenciadores, gerando constrangimento e críticas à condução dos trabalhos. A cena viralizou nas redes sociais e foi interpretada como sinal de falta de seriedade de parte dos parlamentares.

Outro influenciador que prestou depoimento foi Luiz Ricardo Melquiades, o Rico Melquiades. A oitiva dele foi marcada por momentos tensos, com o depoente se recusando a responder parte das perguntas e alegando desconhecimento sobre os contratos que mantinha com plataformas de apostas. Rico foi apontado no relatório alternativo apresentado pelo senador Izalci Lucas (PL-DF) por também participar de publicidade enganosa e por não esclarecer a origem dos recursos que ostenta nas redes sociais.

Prisão durante os trabalhos

Em meio às investigações, um dos personagens centrais da CPI acabou preso. Daniel Pardim Tavares Lima, sócio da empresa de apostas Playflow, foi detido durante seu depoimento na CPI. Ele é acusado de lavagem de dinheiro, participação em organização criminosa e falso testemunho prestado à própria comissão. Segundo Soraya, Pardim mentiu ao dizer que não conhecia a sócia de sua empresa, Adélia de Jesus Soares. A empresa de ambos, Peach Blossom River Technology, participa de outra companhia chamada Payflow, que atua no setor de pagamentos digitais e presta serviços às apostas on-line, segundo a relatora. A Payflow é investigada pela Polícia Civil do Distrito Federal por indícios de lavagem de dinheiro e transferências ilegais.

Divergências, recuos e clima de desgaste

O presidente da CPI, senador Davi Alcolumbre (União-AP), foi pressionado a prorrogar os trabalhos por mais 60 dias, mas recusou. Segundo relatos de bastidores e falas públicas, Alcolumbre avaliou que a comissão estava “descambando para o circo” e que não havia clima político para estender uma CPI que, além de dividir os senadores, vinha sendo alvo de críticas pela exposição midiática excessiva e pela condução de alguns depoimentos.

O senador Angelo Coronel (PSD-BA) votou contra o relatório, alegando falta de tempo para análise e criticando o que chamou de “indiciamentos apressados”. “Analisar em 24 horas é fingir que analisou. Quando você traz uma pessoa para a CPI, você execra o cara, já vira bandido”, afirmou. Coronel também destacou que a legalização do setor, por meio da Lei das Bets, trouxe mais controle e arrecadação para o Estado.

Eduardo Gomes (PL-TO) também foi contra o relatório e questionou a divulgação de dados sigilosos no texto. “A CPI acerta ao apontar falhas na fiscalização, mas exagera no ataque à honra de alguns investigados. CPI não pode virar espetáculo”, afirmou, defendendo uma reformulação do funcionamento desse tipo de comissão no Congresso.

Já Eduardo Girão (Novo-CE) votou a favor, apesar de ter feito críticas severas à condução dos trabalhos. Segundo ele, houve omissões graves e falta de apuração de denúncias feitas contra um suposto lobista que estaria usando a CPI para extorquir empresários do setor.

Propostas que não avançaram

Além dos indiciamentos, a CPI elaborou um pacote de propostas legislativas, que acabou arquivado junto com o relatório. Entre os principais pontos estavam:

  • Proibição de jogos eletrônicos que simulam caça-níqueis, como o “Jogo do Tigrinho”;
  • Vedação para que pessoas inscritas no CadÚnico façam apostas online;
  • Limite de três horas de apostas por dia, ininterruptas ou não;
  • Proibição de bônus, apostas grátis e ferramentas que aceleram os jogos, como autoplay e turbo;
  • Criação de um Cadastro Nacional de Apostas, com autoexclusão válida para todas as plataformas;
  • Criação de um fundo para combater plataformas ilegais, financiado com parte da arrecadação das empresas legalizadas;
  • Aumento das penas para exploração ilegal de apostas e para publicidade enganosa, incluindo prisão de até 8 anos.

Já o relatório alternativo de Izalci Lucas previa, além de parte dessas medidas, licitação obrigatória para exploração de apostas, restrição de publicidade entre 6h e 22h e a criação do SUS Apostas, com 10% da receita bruta das apostas destinado ao tratamento de vício em jogo na rede pública de saúde.

CPI ficou aquém das expectativas

A CPI das Bets realizou 21 reuniões, ouviu apenas 19 dos mais de 150 convocados e aprovou metade dos 192 pedidos de dados sigilosos. Seis testemunhas sequer compareceram às oitivas. No fim, o colegiado acabou se dividindo não apenas sobre os rumos do relatório, mas também sobre a própria eficácia das CPIs no combate às irregularidades.

Ainda assim, Soraya defendeu que a CPI cumpriu papel relevante ao abrir o debate sobre os impactos das apostas online na saúde mental da população, na economia doméstica das famílias e nas lacunas da fiscalização estatal. Mesmo rejeitado, seu relatório agora dependerá das autoridades competentes para gerar eventuais desdobramentos.

*Estagiária sob supervisão de Carlos Alexandre de Souza

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Jeová Rodrigues

Jornalista

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