Último Boletim da Previdência foi publicado em dezembro. À época, eram 2,043 milhões de pedidos de benefício sem respostas
O Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) deixou de divulgar mensalmente os dados sobre a fila de pedidos de benefícios previdenciários e assistenciais, provocando um apagão nos dados sobre brasileiros que aguardam atendimento. O último Boletim Estatístico da Previdência Social (Beps) foi publicado em dezembro de 2024. À época, somando todas as filas de reconhecimento inicial de direitos, eram 2,043 milhões de pessoas à espera da liberação de algum benefício.
A falta de transparência acontece em meio aos escândalos de fraude e descontos indevidos de entidades associativas em contracheques. A fila do INSS refere-se ao tempo de espera para análise e concessão de benefícios previdenciários, como aposentadorias, auxílios-doença e pensões. A demora na análise traz dificuldades financeiras para quem depende deles.
O recorde de espera na fila do INSS foi registrado em julho de 2019, quando chegou a 2.442.816 pessoas. Sem a atualização dos dados, há estimativas de que agora esse número já possa ter ultrapassado 2,5 milhões de pedidos.
Procurado pelo Correio, o Ministério da Previdência Social não deu uma explicação sobre o motivo do atraso na divulgação, tampouco uma previsão sobre a atualização dos dados. “Os dados estão sendo consolidados e serão divulgados o mais brevemente possível”, informou a pasta, em uma breve nota.
O Sindicato Nacional dos Aposentados, Pensionistas e Idosos (Sindnapi) também evitou repercutir o assunto. “Não vamos comentar enquanto não houver informações mais claras. Em princípio, é importante que o processo de concessão de benefícios seja o mais ágil possível”, afirmou a entidade.
A operação da Polícia Federal (PF), que identificou o esquema fraudulento que aplicou R$ 6,3 bilhões em descontos associativos indevidos entre 2019 e 2024, apontou que o esquema impactou diretamente no andamento da fila para atender a quem aguarda o benefício. Em relatório consta o tópico “Impacto negativo na fila de requerimentos do INSS” e indica que a espera foi impactada direta e negativamente pela inclusão fraudulenta de descontos associativos.
De acordo com o relatório, a fila voltou a crescer em 2024, concomitantemente ao esquema de fraude. Tanto que no início do mês o governo editou uma medida provisória (MP) para retomar o bônus para peritos para combater filas.
Em julho de 2023, o Executivo relançou o pagamento de bônus de produtividade para servidores e peritos, autorizou a realocação emergencial de pessoal. Resultados rápidos foram colhidos, o tempo médio de espera por concessão de benefícios caiu de 76 dias, em janeiro, para 34 dias em julho de 2024, mas o alívio durou pouco. A partir de agosto, a fila voltou a crescer, atingindo 39 dias de espera em novembro.
Considerado um problema crônico, o longo tempo de espera para análise e concessão de benefícios foi alvo, inclusive, de uma das promessas de campanha do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que era de zerar a fila. O Programa de Enfrentamento à Fila da Previdência Social (PEFPS), visava reduzir o tempo de análise de processos e perícias médicas, prevendo bônus para servidores que realizarem trabalho extra para agilizar os processos e perícias, além de outras medidas como o uso de telemedicina em determinados.
Contudo, a estratégia se mostrou ineficaz, conforme destacou o especialista em direito previdenciário Washington Barbosa, CEO da WB Cursos. “Os peritos têm uma meta de trabalho durante o dia. O que fizerem além dessa meta, ganham um valor adicional por cada processo ou perícia que faz além disso. Isso incentiva, sim, e melhora um pouco a produção. Mas temos de ter cuidado com alguns aspectos”, alertou.
O regime geral de previdência social determina que o benefício tem que ser concedido em até 45 dias, o que não acontece há muitos anos, conforme observou o advogado. “Os prazos chegaram a oscilar entre 60 e 180 dias. Foi feito um acordo entre o Supremo Tribunal Federal, Advocacia Geral da União e o INSS, exatamente para estabelecer prazos. E esses prazos foram todos maiores que os 45 dias. Esse acordo está valendo, mas, pelo que eu sei, não está sendo cumprido. Isso é outra coisa que não tem sido dada em transparência”, apontou Barbosa.
Greve
Apesar do bônus para os peritos, a Federação Nacional de Sindicatos dos Trabalhadores em Saúde, Trabalho, Previdência e Assistência Social (Fenasps), entidade que representa a categoria, afirmou que o programa tinha “metas inatingíveis e condições de trabalho cada vez mais precárias”. O movimento resultou em uma greve dos trabalhadores do órgão entre julho e novembro de 2024 e a paralisação dos médicos peritos desde outubro.
A falta de pessoal e a ausência de uma reestruturação de carreira são os maiores problemas apontados pelos servidores. Atualmente, o INSS opera com cerca de 19 mil servidores — menos da metade do efetivo de sete anos atrás.
A greve dos peritos, que durou 235 dias, foi encerrada em abril deste ano, marcando a maior paralisação da história da categoria. De acordo com a Associação Nacional dos Peritos Médicos Federais (ANMP), o pacto firmado ainda não correspondia à expectativa dos trabalhadores, mas “garante a estabilização do conflito classista e a segurança dos peritos”.
O acordo estabelecido com o Ministério da Previdência Social estabeleceu que os profissionais deveriam repor os dias não trabalhados e teriam os salários descontados restituídos. “O modelo ideal de carreira ainda não é uma realidade, mas continuaremos lutando até o fim pela valorização, pelo respeito e pela dignidade que merecemos”, informou a ANMP em nota.
Controle social
Considerada a maior crise do terceiro mandato do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o escândalo da fraude resultou na demissão do então ministro da Previdência Carlos Lupi, na exoneração do então presidente do instituto Alessandro Stefanutto, e no afastamento de quatro dirigentes da autarquia e de um policial federal lotado em São Paulo.
Assumiu o ministério, o ex-deputado federal por Pernambuco, Wolney Queiroz, e o comando do INSS passou para o Procurador federal de carreira, Gilberto Waller. A dança das cadeiras segue em Brasília, com a troca de cargos de confiança. Enquanto isso, os dados sobre a fila de espera de benefícios seguem desconhecidos e os órgãos sem perspectiva concreta de atualização.
Segundo a avaliação do advogado Bruno Minoru Okajima, especialista em Direito do Trabalho e sócio do escritório Autuori Burmann Sociedade de Advogados, o “apagão de dados” compromete o controle social sobre um problema que vem se agravando nos últimos meses. “A ausência de informações sobre o tempo de espera e o número de requerimentos pendentes dificulta o acompanhamento pela sociedade, imprensa e órgãos de fiscalização”, afirmou. “Isso mina a possibilidade de cobrar soluções, avaliar políticas públicas e garantir o direito constitucional à informação.”
O especialista dá dicas de como proceder diante da situação. “A recomendação para quem enfrenta demora excessiva é acompanhar de perto o processo pelo aplicativo Meu INSS, responder com agilidade às exigências e registrar reclamação na ouvidoria. Se ainda assim não houver resposta, é possível entrar com ação judicial, inclusive com pedido de liminar”, orientou o advogado.
Okajima também ressaltou a importância de reunir corretamente toda a documentação desde o início do processo. “Ter em mãos documentos de identificação, laudos médicos atualizados, comprovantes de contribuição e vínculos empregatícios evita exigências e acelera a análise. Isso pode fazer toda a diferença para evitar a judicialização”, concluiu.
Orçamento
Frequentemente apontada como vilã das contas públicas, a Previdência Social possui o maior orçamento entre os ministérios da Esplanada. Para este ano, a Lei Orçamentária Anual (LOA) prevê gastos de aproximadamente R$ 1,0 trilhão para a pasta.
O montante é quase quatro vezes maior do que o Orçamento destinado ao Ministério do Desenvolvimento e Assistência Social, que inclui programas como o Bolsa Família, que tem a cifra de R$ 288,4 bilhões. O valor também é exorbitantemente maior do que os R$ 245 bilhões destinados para despesas com a saúde pública e R$ 226 bilhões para a educação.
O orçamento elevado para a Previdência é atribuído a diversos fatores, incluindo o aumento da longevidade da população, e o fato de muitos brasileiros terem remunerações baixas, o que resulta em contribuições menores. Além disso, a existência de regimes previdenciários com diferentes regras e benefícios, e a falta de equilíbrio entre arrecadação e despesa, contribuem para o aumento do Orçamento.
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