Justiça aceita denúncia e torna réu ex-delegado-chefe da PCDF por 10 crimes
Além dele, o ex-delegado da delegacia de Ceilândia irá responder por cinco crimes. De acordo com o MP, os dois utilizaram a estrutura de forças de segurança do DF para perseguir uma jovem
O juiz Frederico Ernesto Cardoso Maciel aceitou, nesta terça-feira (16/1), denúncia apresentada pelo Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT) e tornou réu o ex-delegado-chefe da Polícia Civil do Distrito Federal (PCDF) Robson Cândido. Com a decisão, o ex-chefe da corporação irá responder por 10 crimes.
O magistrado do Juizado de Violência Doméstica e Familiar Contra a Mulher de Águas Claras, antes de aceitar a denúncia contra Cândido e o ex-delegado da 19ª Delegacia de Polícia (P Norte) Thiago Peralva, revogou a decisão anterior, quando o mesmo aceitou a denúncia apresentada pelo MP contra a dupla — em 17 de novembro do ano passado. A medida ocorreu porque os promotores apresentaram mais provas para incriminar os delegados, além de estar em uma só ação penal.
Com isso, Cândido irá responder por 10 crimes cometidos contra a ex-namorada, utilizando muito deles a estrutura da segurança pública. Os crimes são stalking (perseguição); violência psicológica; descumprimento de medida protetiva; peculato, por três vezes; corrupção passiva, por três vezes; intercepção telefônica ilegal, por duas vezes; uso do sistema OCR do Departamento de Estrada e Rodagem (DER-DF), por diversas vezes; uso do sistema OCR do Departamento de Trânsito (Detran-DF) por 30 vezes; violação do sigilo funcional do sistema OCR do Detran; uso do sistema Vigia, no âmbito da Operação Falso Policial, por 96 vezes; e uso do sistema Vigia, no âmbito da Operação Alcatéia, por 58 vezes.
Já o ex-chefe da 19ª DP irá responder por cinco crimes: stalking (perseguição); corrupção passiva, por três vezes; intercepção telefônica ilegal, por duas vezes; uso do sistema OCR do DER-DF por 30 vezes; uso do sistema Vigia, no âmbito da Operação Falso Policial, por 96 vezes; e uso do sistema Vigia, no âmbito da Operação Alcateia, por 58 vezes. Ao acolher a denúncia do MP, o juiz considerou que os fatos demonstram crimes.
“A denúncia descreve fatos criminosos com todas as suas circunstâncias, faz a qualificação dos acusados, indica as condutas praticadas, vem acompanhada de mínimo probatório (justa causa) e faz a classificação dos crimes”, escreveu Frederico.
A reportagem procurou a defesa dos dois réus. O espaço segue aberto para manifestações.
Crimes
A denúncia é acerca de últimas provas colhidas pelo MP, com novos elementos contra os dois delegados. Os promotores explicam, em 106 páginas, os crimes cometidos por Robson Cândido, com ajuda do ex-chefe da 19ª DP, Thiago Peralva.
A denúncia revela que, além da vítima ter tido o número colocado em uma interceptação telefônica na 2ª Vara de Entorpecentes — amplamente divulgado pelo Correio, a dupla “plantou” antes o número da jovem em uma investigação já encerrada que tramitava na 1ª Vara Criminal de Ceilândia.
Peralva plantou o número da vítima no sistema Vigia, a mando do ex-chefe, no âmbito da Operação Falso Policial, que investigava crimes de extorsão em Ceilândia. A operação durou de 13 a 28 de setembro, sendo finalizada coincidentemente no dia após a vítima procurar a 27ª Delegacia de Polícia (Recanto das Emas) para relatar os abusos que sofria.
Para o MP, a jovem não tinha nenhuma relação com os crimes e a única intenção era saber os passos da vítima, além de saber com quem ela falava e os lugares que frequentava. Ao todo, Peralva — que manuseava do acesso ao sistema — fez consultas diárias e por diversas vezes, totalizando nada menos que 96 acessos.
Porém, segundo as investigações, Peralva incluiu o número da vítima, em 26 de setembro, em uma outra interceptação telefônica em curso, agora na 2ª Vara de Entorpecentes que apurava tráfico de drogas, no âmbito da Operação Alcatéia. O ato prosseguiu até 31 de outubro, quando Cândido já havia deixado o cargo máximo da corporação. Nessa, ao menos 58 vezes a vítima foi monitorada pelo ex-chefe da delegacia de Ceilândia, a mando do chefe.
OCR
Entre o período de 6 de agosto a 22 de setembro, Cândido utilizou indevidamente o sistema OCR administrado pelo DER-DF, por meio de demandas dirigidas à Divisão de Inteligência Policial (DIPO) da corporação, para localizar a placa da vítima. A ferramenta é utilizada para ler com mais clareza placas dos veículos e ajudar a monitorar motoristas que estão em situação irregular, além de ser um aparelho em que ajuda as forças de segurança.
O ex-delegado-chefe da corporação, em 6 de agosto, com o propósito de descobrir onde a ex-namorada se deslocava, acionou a inteligência da corporação para verificar uma “situação supostamente criminosa” envolvendo um veículo.
Para explicar o porquê da consulta, Cândido enganou um dos delegados e contou que o carro estava sendo envolvido em um “esquema de estelionato relacionado a leilões”. Ocorre que o veículo era da ex-namorada dele. A mesma situação ocorreu, ao menos, em outras cinco vezes. Em todas, o ex-delegado-chefe era municiado de informações colhidas pela DIPO com o sistema OCR do DER.
Não satisfeito, o ex-delegado-chefe também solicitou as informações de OCR a Peralva. Os promotores citam que, ao todo, Peralva acessou 30 vezes o sistema para obter informações sobre o deslocamento da vítima, principalmente na região onde ela residia, em Águas Claras.
O intuito era diminuir os pedidos de Cândido à inteligência, a fim de evitar exposições. O ex-chefe só conseguiu acesso ao sistema por meio de uma conta de outro policial civil, entre 20 e 29 de setembro. Dos 30 acessos, 24 foram realizados na própria residência de Peralva — sendo repassadas todas as informações da localização da vítima ao chefe.
O sistema OCR do Detran, conforme a própria reportagem já havia revelado anteriormente, também é citada na nova denúncia do MP apresentada à Justiça na sexta-feira (5/1).
Pesquisas
Um dos pontos revelados pelo MP na nova denúncia são pesquisas que Robson Cândido buscou na internet. No Google, o ex-delegado-geral pesquisou “crime de stalking”, “localizar ERB (Estação de Rádio Base) de celular”, “pesquisar OCR de carro”, “interceptação telefônica”, “uso de viaturas improbidade” e “passo a passo de processo de violência contra mulher”.
Os dados foram encontrados no aparelho apreendido do ex-chefe da corporação. Para o MP, as buscas “traduz-se em uma verdadeira confissão dos delitos já denunciados e expõe o nível de obsessão nutrido por Robson em relação à vítima e demonstram que os atos criminosos por ele praticados foram minuciosamente premeditados”.
Cândido está solto e utiliza tornozeleira eletrônica, assim como Peralva. Recentemente, o MP teve um pedido de prisão do ex-delegado-chefe da PCDF negado.
Com informações do Correio Braziliense
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