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Ajuste fiscal de Javier Milei derruba inflação e turbina PIB da Argentina

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“Os argentinos, hoje, estão infinitamente melhor do que o Brasil”, avalia Fabio Giambiagi, que acaba de concluir estudo sobre as medidas do país vizinho

Em pouco mais de um ano após Javier Milei assumir a presidência da Argentina, o país vizinho passa por uma transformação que está relacionada com o ajuste fiscal duro realizado pelo economista ultraconservador. A hiperinflação, que estava em 26% ao mês, em dezembro de 2023, passou para menos de 3% ao mês nos últimos meses, aumentando o poder de compra da população.

As mudanças estão sendo percebidas nos números recentes da economia, destaca o economista Fabio Giambiagi, pesquisador associado do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (FGV Ibre). “Os argentinos, hoje, estão infinitamente melhor do que o Brasil. Evidentemente, o estilo de Milei está longe de agradar, mas não podemos brigar com os números.

O ajuste que foi feito tem resultados impressionantes e deixa o Brasil mal na foto”, pontua Giambiagi, em entrevista ao Correio, comparando com o persistente desequilíbrio das contas públicas brasileiras, que estão no vermelho desde 2014. “O ajuste fiscal argentino está fazendo, agora, a economia do país vizinho crescer em um prazo bastante curto. Enquanto isso, no Brasil, a economia cresce e o governo não consegue reduzir os gastos. Tem alguma coisa errada com o Brasil”, afirma.

Em meio aos escândalos de corrupção no Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) desvendados pela Polícia Federal, em parceria com a Controladoria-Geral da União (CGU) e Tribunal de Contas da União (TCU), Giambiagi evitou fazer comentários sobre os desvios bilionários das contas dos beneficiários do sistema de aposentadorias dos trabalhadores do setor privado. “Isso é um assunto policial e o governo vai ter que ressarcir por questões morais e políticas, caso contrário não vence as eleições em 2026”, afirma. Para ele, o aguardado e prometido ajuste fiscal não ocorrerá neste mandato. “O ajuste fiscal vai ocorrer mesmo em 2027”, frisa.

Vale lembrar que o Projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias (PLDO) de 2026, enviado pela equipe econômica ao Congresso, no mês passado, de forma acanhada, confirma um cenário preocupante para as contas públicas. Há um buraco de R$ 118 bilhões de despesas que ainda não possuem receita correspondente e, a partir de 2027, o funcionamento da máquina pública estará comprometido devido ao aumento desenfreado de gastos em receitas correspondentes e a volta da inclusão dos gastos com precatórios (dívidas judiciais da União), que estão sendo parcialmente fora da meta fiscal até o próximo ano.

Enquanto isso, a previsão de despesas discricionárias, que podem ser cortadas, passariam de R$ 122,2 bilhões, em 2027, para menos da metade, em 2028, de R$ 59,5 bilhões, em grande parte, devido ao forte aumento das despesas obrigatórias sem uma receita equivalente e recorrente — na contramão da Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF). “A Argentina tem superavit primário há 14 meses, como consequência das reformas realizadas, o que permitiu reduzir a inflação, portanto, reduziu o imposto inflacionário que é extremamente nocivo para os mais pobres, que veem sua renda ser corroída.

As previsões são de aumento do crescimento econômico e redução da pobreza”, destaca a economista Selene Peres Nunes, uma das autoras da LRF, que completou 25 anos no último dia 4. Na avaliação dela, o governo argentino “está no caminho certo”. “A ideia de reduzir a pobreza com base em aumento de deficit fiscal, como faz o Brasil, não é nem eficiente, nem sustentável ao longo do tempo”, alerta a especialista em contas públicas.

“Mudança de paradigma”

O conjunto de medidas econômicas adotadas por Milei, com um mix de reformas estruturais, foi um pacote “sem precedente”, na Argentina, segundo Giambiagi. Ele destaca que atravessava uma grave crise econômica, marcada por uma combinação de alta inflação, estagnação econômica, reservas internacionais negativas, risco país em mais de 3.000 pontos – dado que recuou para algo em torno de 450 pontos, em janeiro deste ano – e elevada pobreza.

“O programa econômico combinou uma forte desvalorização cambial inicial, seguida de um crawling peg (regime de flutuação cambial) de 2% de desvalorizações mensais durante 2024, com liberalização de preços e um severo ajuste fiscal. Em particular, o gasto público primário diminuiu 27% em termos reais em 2024 (4,5 pontos do PIB).

A inflação cedeu de 26% em dezembro de 2023 para menos de 3% ao mês nos últimos meses e o setor externo melhorou substancialmente em 2024 com a recuperação agrícola após a seca prévia, mas enfrenta riscos claros, devido à apreciação cambial real”, informa o documento de 56 páginas que avalia com o ajuste fiscal de Milei como uma “mudança de paradigma”.

Uma das principais medidas adotadas pelo presidente argentino e destacada no estudo foi a reforma das tarifas públicas, que emergiu como um segundo pilar inicial do programa, dada a situação inicial de completa distorção dos preços relativos da economia.

Na Argentina, os subsídios nos oito anos dos governos Mauricio Macri e Alberto Fernández consumiram 2,4% do PIB de despesas fiscais. Vale lembrar que, apenas os gastos tributários previstos pelo governo brasileiro devem chegar a R$ 620,8 bilhões em 2026, o equivalente a 4,53% do PIB, sem contar os subsídios creditícios, conforme dados do PLDO de 2026.

O estudo dos pesquisadores do FVG Ibre destaca ainda o impacto na inflação da eliminação de subsídios orquestrada por Milei. O primeiro impacto foi um salto de 200% nos custos de energia elétrica, seguido por reajustes substanciais de ordem de grandeza aproximada no gás natural e no transporte público. E, para amenizar o impacto sobre as famílias mais vulneráveis, implementou-se uma segmentação tarifária baseada na renda, já tentada no passado, mas escassamente instrumentalizada.

De acordo com Giambiagi, apesar da retórica agressiva e fortemente ortodoxa e liberal, Milei deu mostras de uma flexibilidade relativamente surpreendente, à luz do teor das suas manifestações na campanha eleitoral de 2023, tanto que ele não conseguiu eliminar todos os auxílios aos mais pobres e, “simultaneamente, certa racionalização da máquina estatal seguiu o receituário tradicional de ajuste macroeconômico, indicando uma clara adesão aos princípios básicos da ortodoxia econômica”.
De acordo com o estudo, a execução do programa econômico de Milei destacou-se, a rigor, pelo pragmatismo, que contrasta com algumas das suas propostas de campanha.  

Empréstimo liberado após elogios

Os resultados positivos das medidas econômicas de Javier Milei foram elogiados pelo Fundo Monetário Internacional (FMI), que considerou que o país caminha na direção correta. Não à toa, o governo conseguiu a liberação de um empréstimo de US$ 20 bilhões do FMI e um pacote de US$ 12 bilhões do Banco Mundial para apoiar as reformas.

No encontro de primavera (no Hemisfério Norte) do FMI, a diretora-gerente do Fundo, Kristalina Georgieva, citou a Argentina como exemplo entre países que estão se adaptando aos novos fundamentos, políticas e condições econômicas globais.

A executiva defendeu que acelerar reformas econômicas, regulatórias, fiscais e comerciais para remover barreiras ao crescimento é uma atitude positiva para enfrentar os novos desafios globais. “A Argentina está se movendo com reformas disciplinadas, colocando as condições financeiras na linha”, afirmou Georgieva, na ocasião, destacando que o PIB argentino deve reverter a recessão de 2024 e crescer 5,5% neste ano, a depender dos impactos do aumento das tensões globais.

O estudo de Fabio Giambiagi e Emerson Tizziani também elogia as medidas implementadas pelo governo de Milei. “O impacto setorial das desregulações variou significativamente, refletindo características estruturais de cada mercado. Setores mais expostos à competição internacional, como o comércio exterior, apresentaram uma adaptação mais rápida ao novo marco regulatório. Em contrapartida, setores com forte organização sindical ou presença de grupos de interesse consolidados demonstraram maior resistência às mudanças. Essa variação setorial sugere a necessidade de estratégias diferenciadas de implementação”, afirma o documento.

Os pesquisadores ainda destacam que a experiência internacional com programas de desregulação oferece lições importantes para o caso argentino. “Países que conseguiram implementar reformas bem-sucedidas, geralmente, combinaram a flexibilização regulatória com o fortalecimento das instituições de supervisão e proteção ao consumidor. O desafio argentino consiste em encontrar o devido equilíbrio entre a necessária desregulação — inevitável no contexto do intervencionismo exacerbado praticado até então — e uma construção institucional que permita a existência de mercados mais eficientes, porém sem comprometer objetivos sociais fundamentais”.  

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Jeová Rodrigues

Jornalista

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