Avanço eleitoral na Europa e nos EUA dá fôlego aos conservadores brasileiros
Especialistas e políticos destacam como movimentos à direita alimentam os debates por aqui
Em meio ao fortalecimento da extrema-direita na Europa e a possibilidade da vitória do republicano Donald Trump nos Estados Unidos, os conservadores do Brasil se alvoroçaram com a expectativa de que essa onda possa influenciar nas eleições municipais de outubro. Paralelamente, a esquerda teme o enfraquecimento de sua base e atua para evitar o avanço do discurso de direita. Ao Correio, especialistas e políticos destacam como esses movimentos alimentam os debates por aqui.
Para o professor de Relações Internacionais da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP) e coordenador do Observatório da Extrema Direita, David Magalhães, o comportamento do eleitorado europeu pode reforçar, sim, os discursos conservadores brasileiros, mas o impacto é menor do que os reflexos das eleições nos Estados Unidos, por exemplo. “A direita brasileira conhece muito pouco a direita europeia, a direita radical e a extrema-direita. A não ser o eixo mais ibérico com os partidos Chega (Portugal) e Vox (Espanha), que tem conexões, sim, com o bolsonarismo, no entorno sul-americano”, disse.
Magalhães destaca a diferença entre as agendas que separa a direita brasileira da europeia. Ele deu como exemplo o chamado PL do Aborto, projeto de lei que tem apoio da ala conservadora do Congresso.
“A direita brasileira é visceralmente vinculada a uma concepção religiosa, essa direita radical bolsonarista que, consequentemente, se coloca contrária ao aborto em todas as circunstâncias. A direita radical francesa — que se saiu muito bem nas eleições — tem uma raiz laica e secular que não dá para comparar com a direita radical religiosa daqui. E tem agendas que são mais específicas da realidade europeia como a agenda anti-imigração”, explicou.
Na avaliação do especialista em relações internacionais Rodrigo Gallo, as eleições nos Estados Unidos podem influenciar mais o Brasil do que a da Europa. “Para nós, em particular, isso pode ter um peso grande, uma vez que teremos eleições municipais no segundo semestre, e que sempre servem como laboratório para as eleições nacionais”, ressaltou.
O professor David Magalhães partilha do mesmo entendimento. “A nossa direita, basicamente, mimetiza a dos Estados Unidos. Quando George W. Bush fez a Guerra do Iraque, parte da direita reproduziu os argumentos dos neoconservadores americanos aqui, no Brasil. Depois, quando ascendeu o Trump com uma plataforma mais populista, antipolítica, essa agenda também foi reproduzida no Brasil”, disse.
Segundo ele, tanto a direita quanto a esquerda no Brasil são influenciadas pelo pleito estadunidense. “Os Estados Unidos têm uma presença histórica não só na direita, mas na esquerda também. Muitos modismos acadêmicos dos progressistas reproduzem, inclusive, a linguagem da esquerda americana”, completou Magalhães.
Fator Bolsonaro
Sobre as últimas derrotas no Congresso em pautas de costumes, Lula negou, na semana passada, ter subestimado a ala conservadora. Disse não ter experiência em lidar com a “extrema-direita ativista” e pouco pragmática na política.
Na OIT, duas semanas atrás, já tinha falado da necessidade de combater o extremismo.
“O extremismo político ataca e silencia minorias, negligencia os mais vulneráveis e vende muita ilusão. A negação da política deixa um vácuo a ser preenchido por aventureiros que espalham a mentira e o ódio. A contestação da ordem vigente não pode ser privilégio da extrema-direita. A bandeira anti-hegemônica precisa ser recuperada pelos setores populares progressistas e democratas”, pregou.
Em 10 de junho, o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) comemorou, nas redes sociais, a derrota do presidente da França, Emmanuel Macron, nas eleições do Parlamento Europeu. Segundo ele, “a Europa se cansou da esquerda” e, em breve, o Brasil será o próximo a entrar “nessa corrente do bem”.
O senador Humberto Costa (PT-PE) lembrou que o Brasil é palco de forte polarização ideológica. Para ele, apesar das conquistas, o governo tem sofrido com a articulação política. “A articulação do governo tem muitas conquistas, mas, politicamente, não consegue ter articulação interna boa com o Congresso. A situação, hoje, é preocupante, espero que melhore”, admitiu.
A deputada federal e presidente do PT, Gleisi Hoffmann (PR), afirmou que o crescimento dos extremistas de direita nas eleições do Parlamento Europeu é mais um sinal de alerta para o campo progressista.
“Além de combater a rede de mentiras do novo fascismo, os governos democráticos precisam responder às demandas reais da população. Garantir vida digna, emprego e renda; trabalhar pela paz e cooperação entre povos e países é o caminho para deter os inimigos da democracia e da justiça social em todo o mundo”, argumentou.
Entusiasmo
Ao Correio, a deputada federal Bia Kicis (PL-DF) dissse que viu com “muita alegria” o resultado das eleições ao Parlamento Europeu. “Reflete o sentimento do povo que não aguenta mais as pautas ideológicas da esquerda, que estão destruindo a família e destruindo a base da democracia, que são as liberdades. Acreditamos, sim, que esse mesmo movimento se repetirá nos EUA, nas eleições de novembro e aqui no Brasil”, vaticinou.
O deputado federal Ricardo Salles (PL-SP), ex-ministro do Meio Ambiente de Bolsonaro, corrobora que a mudança política vista na Europa traz relevância ao cenário brasileiro. “Certamente, tem reflexos aqui. Comercialmente eles têm uma visão protecionista que impõe desafios, e, na pauta conservadora, não são iguais aos americanos. Também há a questão da imigração que é muito forte por lá”, disse.
A senadora Damares Alves (Republicanos-DF) defende a onda conservadora. “As pessoas se cansaram das narrativas e ideologias dos governos esquerdistas. As políticas econômicas baseadas na atuação excessiva do Estado, com sucessivos aumentos de impostos, sem o devido retorno em políticas públicas, pressiona a classe média e os produtores de riqueza. Nossos mercados ficam menos competitivos”, alegou. “Acredito que nos EUA teremos um governo conservador e isso vai se refletir, naturalmente, na América Latina como um todo, principalmente, no Brasil”, concluiu a senadora.
Com informações do Correio Braziliense
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