“20 milhões de pessoas foram protegidas da fome”, diz ministro Wellington Dias
Mesmo sem dados oficiais, ministro do Desenvolvimento e Assistência Social afirma que ações do governo reduziram o número de brasileiros atingidos pelo flagelo, que era de 33 milhões em 2022
O ministro do Desenvolvimento e Assistência Social, Família e Combate à Fome, Wellington Dias, comemora que, com a mudança nas regras do Bolsa Família, cada vez mais beneficiários do programa estão conseguindo trabalho de carteira assinada. Para o titular da pasta, isso mostra que o pobre, mesmo quando recebe o auxílio, quer progredir, trabalhar.
Os dados do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged), do Ministério do Trabalho, confirmam o fenômeno. No acumulado entre janeiro e novembro de 2023, o governo comemora a geração de 1,9 milhão de empregos com carteira assinada. Desses, mais de 1,3 milhão são beneficiários do programa de transferência de renda — 71% dos empregos gerados no último ano foram para esse público.
Apesar de admitir que o Brasil ainda não sairá do Mapa da Fome da FAO — Organização para Agricultura e Alimentação das Nações Unidas —, ele disse que o número de 33 milhões de brasileiros em situação de fome deve cair mais da metade.
Sem os números fechados ainda, o ministro afirmou ao Podcast do Correio que a expectativa é de que, desse grupo, cerca de 20 milhões tenham deixado de passar fome, apenas em 2023. A seguir, os principais trechos da entrevista.
O ex-presidente Jair Bolsonaro já disse que nunca viu ninguém pedindo pão em uma padaria. A fome está oculta?
Tenho certeza de que os donos de padaria daquela época e, infelizmente, ainda hoje, veem pessoas em busca de comida. A cara da fome, muitas vezes, é visível, porque está ali, numa situação de costelas aparecendo. Lembramos das cenas dos ianomâmis, no começo do ano. Mas, muitas vezes, a fome se esconde por trás da obesidade, pessoas que não têm uma nutrição adequada. Por isso que trabalhamos cuidando da questão da fome e da obesidade. Fizemos uma integração, principalmente, com o Ministério da Agricultura, o Ministério do Desenvolvimento Agrário, o Ministério da Pesca, para que o Brasil tivesse um Plano Safra que fosse mais do que um plano de crédito. Mesmo que o Brasil produza para vender para outros países, vamos também produzir para alimentar primeiro os brasileiros. Faltou milho porque tinham exportado demais, faltaram feijão, farinha, goma, frutas… Já são 279 bancos de alimentos em todo o Brasil — onde aquele alimento que é, do ponto de vista nutricional, adequado é transformado em polpa de fruta, em alimento desidratado, para, com isso, poder dar tempo de chegar a quem precisa.
E de onde saiu o número de 33 milhões de brasileiros com fome?
Esse número tem como referência a informação que é coletada, de um lado, pela área da saúde, do outro, pelas visitas das equipes do SUAS (Sistema Único de Assistência Social). Temos situações mais complexas, como população em situação de rua, que não tem propriamente uma moradia que esteja na rotina da visita. Por isso, estamos reativando os Centros Pop, um centro especializado na população de rua.
A fome dobrou nos últimos 20 anos, mesmo com oito anos de Lula e seis de Dilma, por quê?
No começo do século 21, 47% da população estava na pobreza, um número feio. Uma grande parte passando fome. Eu sou do Piauí, que tinha as frentes de emergência. Botava o povo para receber leite. Ali foi lançado um programa, que passou a ser referência e implantado em 82 países, um plano para o desenvolvimento da assistência social, que é essa rede SUAS. Por outro lado, houve o sistema da segurança alimentar e nutricional, com a produção, o transporte, a armazenagem e o acesso a esses alimentos. O presidente Lula lançou o programa Fome Zero. A grande aposta foi implementar o Plano Safra para poder olhar quantas toneladas o nosso povo consome de feijão, farinha, tapioca; quantos quilos de carne, frango, e, a partir dali, passou a ter uma organização. Também começou a transferência de renda. Com uma renda, a pessoa ter o acesso para comprar no comércio local. O dinheiro circula e já é um fator econômico. No ano passado, colocamos, nas mãos dos mais pobres do Brasil, cerca de R$ 168 bilhões. Em 2014, reduzimos a pobreza e a fome, que chegou abaixo de 2,5% da população. Em 2018, chegamos à pobreza em 22%, e o Brasil recebeu a certificação para sair do Mapa da Fome, da ONU. Vamos ser medidos agora em julho, teremos a FAO anunciando, em Washington (EUA), o que que aconteceu em 2023. Claro que os dados de 2021 e 2022 não mudam mais, o Brasil ainda vai estar no Mapa da Fome.
Mas como o número dobrou em 20 anos?
Desmantelando tudo. O Plano Safra passou a ser um plano de crédito com juros altíssimos. Boa parte da alimentação que a gente consome é produzida por agricultores familiares. Quando você desmantela o sistema, como o Pronaf e vários outros, desmantela a produção. Deixou de ter a transferência de recursos para os municípios e para os estados. Não tinha mais o controle de quem tem direito, quem não tem direito (ao Bolsa Família). Entrou gente de salário de R$ 10 mil por mês, gente que ganha R$ 130 mil por ano recebendo o Auxílio Brasil, gente que era servidor público, comerciante. Olha que loucura.
Essas pessoas vão ter que devolver?
Quando se verifica isso, quando a pessoa dá uma declaração assinada de próprio punho de que a renda era de R$ 200 por mês, nesses casos, tem dolo, tem crime. A gente encaminhou para o Ministério Público, para o TCU (Tribunal de Contas da União), que acabou de divulgar um relatório com 3,5 milhões de pessoas, parte delas cometendo crime. Vão responder na forma da lei e já teve gente perdendo o emprego.
E quantos brasileiros ainda passam fome?
Vamos fechar o ano de 2023 com queda, reduzindo o número de pessoas passando fome. Não são mais 33 milhões. Acho que a gente tem chance de ter reduzido e pode ter chegado perto de 20 milhões de pessoas que foram protegidas contra a fome, contra a miséria.
Porém restam 13 milhões passando fome?
É isso. Claro que é um prognóstico do Wellington Dias, com base nos dados. Levo em conta que melhoramos tanto o sistema alimentar como o sistema de transferência de renda. O dado bom é que melhoramos a renda fruto do trabalho, esse é o caminho. Primeiro, atender a fome e a transferência de renda. Mas é preciso também a gente cuidar da saúde, garantir que esses atendidos tenham matrícula escolar, possam fazer um curso, ter uma qualificação, acesso a emprego, apoio para crédito, poder produzir no campo, montar um pequeno comércio para sair da pobreza. Lembra da parábola do peixe? Você tem que dar peixe, mas tem que ensinar a pescar. A gente vai viabilizar o equipamento para a pesca. Então, o novo Bolsa Família vai levar o Brasil a sair de novo do Mapa da Fome, com redução da pobreza.
Como a fome e a pobreza são medidas no Brasil?
Todo mundo compreende hoje a importância do Ideb, o Índice de Desenvolvimento da Educação. Estamos trabalhando para ter um índice de desenvolvimento social, o índice monetário da pobreza. A Fundação Getulio Vargas, que já calcula, por exemplo, o INPC, da inflação, aceitou o desafio de, cientificamente, fazer um indicador que leva em conta padrões, por exemplo, do Índice de Desenvolvimento Humano da ONU, e construir um indicador de miséria e de pobreza.
Saíram 20 milhões da pobreza e fome…
Falei aqui da fome. Dos 33 milhões, saíram 20 milhões, porque o indicador de pobreza é maior. Infelizmente, é bem maior, mas só temos dados de 2018. Temos uma projeção para 2021, pela referência do Cadastro Único, de quem tem uma renda per capita abaixo de meio salário mínimo.
A aposta para acabar com a fome é o Bolsa Família?
O principal e o maior programa do mundo no volume de recursos. Estamos falando aqui de um esforço de, aproximadamente, US$ 35 bilhões. Então, não é um programa pequeno. A fome atinge 33 milhões, a pobreza, hoje, atinge 45% da população, mas, no cadastro, o índice é próximo a 40%. Porém a gente voltou a ver o tamanho da pobreza no Brasil.
Como está a questão das fraudes no Bolsa Família?
Havia 3,6 milhões de benefícios que tinham irregularidades, ou mesmo, a prática criminosa. Você tinha situações de pessoas que morreram, e o dinheiro continuava sendo creditado. Aproximadamente 1,3 milhão de beneficiários recebiam, mesmo com uma renda elevada, sem preencher o requisito. Quando a gente vai a campo, checa a família, se é uma fraude. Mas também fomos atrás de quem tinha o direito e estava fora. Foram 2,8 milhões de famílias, cerca de 9 milhões de pessoas, que tinham o direito e não conseguiam acessar o programa. A gente foi lá, deu a mão e trouxe para participar do programa. Quando a gente fala em irregularidade, 1 milhão que recebe irregularmente, são R$ 8,4 bilhões por ano o tamanho da fraude. Por isso o TCU disse que, ao longo de 2022, 2021, 2020, a fraude chegou a R$ 34 bilhões. Dinheiro pago para quem não tinha direito.
Como identificar a fraude?
Temos uma base de dados que chega a 1,3 pentabyte de informações, inclusive, o presidente Lula determinou que a Dataprev seja o cérebro de toda a área social, não só do MDS, mas também integrado com o Ministério do Trabalho, da Saúde e com toda a rede da área social. Isso vai melhorar. Há informações, por exemplo, do Cadastro Nacional de Informações Sociais (CNIS), que tem os dados de salários, de aposentadoria. A gente teve, mais recentemente, uma situação que terminou causando prejuízo ao INSS, com a falsificação de CPFs.
É fato que nem todas as pessoas com direito recebem?
Ainda não chegamos a todas as pessoas que têm o direito. A estimativa que a gente fazia era algo como três milhões de pessoas. Já chegamos a 2,8 milhões, mas ainda tem uma quantidade à qual não chegamos. Vamos continuar, já atualizamos 18 milhões de famílias, ou seja, visitamos 18 milhões de lares, ou os lugares onde vivem. Isso é um desafio gigante.
Como aqui em Brasília, tão perto do ministério, vemos centenas de famílias sem-teto vivendo em barracas e barracos?
É uma realidade, um retrato feio que fica do ano de 2023. Quando a gente assumiu, fui ao presidente Lula e disse: ‘Temos um problema gravíssimo na área da população em situação de rua’. Claro, não é só isso. Temos problemas com crianças abandonadas, idosos, pessoas com deficiência, imigrantes, enfim. Mas eu via esse problema da população em situação de rua como muito grave. Ele disse: ‘Prepare e vamos trazer aqui para a gente fazer um plano’. O ministro Silvio Almeida coordenou um grupo de ministros, e a gente teve um plano agora em dezembro.
Esse programa é o Ruas Visíveis, com um investimento de R$ 1 bilhão, mais o Bolsa Família, com R$ 168 bilhões. Não é muito dinheiro?
É muito dinheiro, mas imagine se não tivesse. Teríamos o caos social. Eu vivi a geração que não tinha (Bolsa Família). A fome não pode esperar, as pessoas com fome estariam saqueando supermercados, armazéns, merenda escolar. Já foi assim, eu vi na minha região, no Nordeste, e em outras. Então, a rede de proteção social é um colchão de amortecimento. Tem, sim, recurso de impostos que são pagos, que são destinados para proteger, mas o Programa Bolsa Família não é só transferência de renda. A gente também prepara para que as pessoas possam sair do programa. Fechamos 2023 com 21,2 milhões porque pessoas que estavam passando fome e não tinha condição nem de ir atrás do emprego, nem o dinheiro da passagem, puderam conseguir trabalho. E veja nossa medida: passamos a fazer um estímulo para as pessoas trabalharem, acabamos com o medo de assinar carteira, as pessoas tinham medo de perder o benefício. Muita gente falava: ‘Olha, eu quero trabalhar na tua casa, mas não dá para tu me pagar só umas diárias?’. O Bolsa Família não é salário, quem quiser crescer, é emprego. O melhor e o mais seguro programa social é o emprego. Conto isso para explicar que o Bolsa Família não é só transferência de renda, é para garantir uma ajuda humanitária enquanto a pessoa resolve a vida. Estou animado porque voltamos para reduzir quem passa fome e diminuir a pobreza, através do crescimento da renda e, ao mesmo tempo, levar as pessoas para a classe média.
Brasileiro não gosta de pobre?
Não posso negar que, infelizmente, uma parcela minoritária existe, a chamada aporofobia, que é, não sei se ódio, mas preconceito contra os mais pobres. Isso que eu acabei de dizer rebate e transforma em mentira a máxima dessas pessoas de que os mais pobres não querem trabalhar. Que, ao colocar o Bolsa Família, as pessoas não querem mais trabalhar. Já fui da pobreza e hoje estou na classe média. Sou bancário da Caixa Econômica Federal. Se alguém da classe média quer crescer, o mais rico quer crescer, imaginem o mais pobre. Com 20 anos do Bolsa Família, temos histórias extraordinárias. Aquele garoto que o presidente Lula entregou o cartão do Fome Zero, em fevereiro de 2003, em Teresina, o nome dele é Natanael, tinha 8 anos, era muito pobre. A mãe dele passou a receber o Bolsa Família, passou a ter obrigação com ele. Hoje, é formado em direito, com a carteira da OAB. Ele é da classe média e advoga a favor dos mais pobres. Olho para trás e, se não fossem algumas pessoas que me receberam na casa delas, para eu poder estudar, que a minha família era muito pobre, se não tivessem me dado a mão, eu não teria chegado onde cheguei. Para poder chegar a um concurso da Caixa Econômica Federal que eu passei.
No caso padre Júlio Lancelotti, como explicar esse ódio?
É lamentável o que foi feito. No dia que aconteceu aquela história da CPI, eu fiz uma manifestação pública. Isso é uma aporofobia, é uma perseguição a quem faz o bem. Mas os vereadores retiraram as assinaturas. Já fui vereador e sei a importância do gesto de reconhecer que você errou ao assinar. Quantas vezes eu tirei o meu nome também de determinadas situações.
O senhor já assumiu quase todos os cargos eletivos. Só falta a presidência?
O primeiro nome aqui se chama Luiz Inácio Lula da Silva, e Geraldo Alckmin. Acho que é uma dupla extraordinária. O Brasil tem um privilégio. Eu sou amigo dos dois já de muito tempo.
O senhor já defendeu a divisão do Ministério da Justiça e da Segurança Pública. O presidente pode dividir a pasta?
Ele anunciou o nome do ex-ministro do STF Ricardo Lewandowski como o novo ministro da Justiça, um excelente brasileiro, que também tive o privilégio de conviver. Sou defensor de que haja um Ministério da Justiça e um Ministério da Segurança. A Justiça cuidando da relação com o Judiciário, com o Ministério Público, com a missão de garantir o cumprimento de penas, quem está preso, quem está em processo de condicional, isso tudo é de uma complexidade extraordinária. E a Segurança, que vai cuidar para reduzir os crimes. Mas, na minha opinião, ele tomou a decisão de manter os dois juntos. Eu mesmo conversei com ele, ainda em 2022, antes da posse, se não era conveniente separar. Ele tomou a decisão de anunciar o ministro Lewandowski. Não seria correto anunciar o ministério e depois dividir no meio. Por isso, acredito que ele vai manter da forma como está.
E a minirreforma ministerial no início do ano? Seu ministério é cobiçadíssimo pelo Centrão. Queriam até dividir o MDS do Bolsa Família…
Essa página está virada, por uma decisão do presidente. É claro que é o presidente toma decisões, mas eu digo que dividir o ministério é zero possibilidade. O presidente se convenceu de que não é possível trabalhar transferência de renda separado de segurança alimentar, separado de inclusão socioeconômica, do emprego, do empreendedorismo, dos 36 programas como moradia, saúde, educação, energia, água, cultura, esporte. Agora, quanto à reforma, tive o privilégio de ter vários momentos com o presidente, no fim do ano passado e este ano, e, em nenhum momento, eu vi o presidente tratar sobre mudanças, diferentemente dessa do Ministério da Justiça, para o lugar do ministro Flávio Dino. O governo, a qualquer momento, pode fazer mudanças, mas ele teve uma reunião com todos os ministros, e a orientação que deu é todo mundo empenhado em trabalhar. Ele chegou a dizer: ‘Vamos parar de ficar ouvindo especulação. Vamos trabalhar, porque eu quero muita entrega’.
Sem reforma então? E o Congresso?
O que ele vai querer, em vez de reforma, é trabalhar com muita entrega. E, claro, vamos continuar buscando ajudar o ministro Alexandre Padilha, os líderes, porque é preciso reconhecer que tem, sim, construção política a fazer. É um ambiente diferente de 2003, que também foi muito tenso, quando, pela primeira vez, um operário ia assumir a condução do país. Em 2003, levamos um ano e meio para ter uma base política para que se pudesse ter uma boa estabilidade política. O ministro Padilha, os líderes e tanta gente ajudou. O próprio presidente, o ministro Haddad, eu também, modéstia à parte, com outros ministros, enfim, eu diria que foi uma vitória muito grande o que aconteceu em 2023. A gente teve, num ambiente tenso, difícil, a aprovação de grandes passos para o Brasil. Em 2024, vamos ter de seguir cuidando para que essa estabilidade se torne cada vez maior na área da política. E vamos começar com o ministro Padilha a visitar os estados. Não é uma disputa pela disputa, é o destino de cerca de 210 milhões de pessoas. E aí a gente tem que estar junto. Fiquei muito feliz em ver a participação nesse ato (8/1), com líderes de diferentes partidos. É um ato político, sim, mas com P maiúsculo, no sentido da defesa, do fortalecimento da democracia. Se a gente pode se unir num ato como esse, como é que a gente não pode se unir em medidas concretas em favor do Brasil? Acho que vamos conseguir.
Como avalia a economia?
Acho que ainda há um resto de pessimismo da parte de alguns, mas nós vamos ter crescimento econômico, estabilidade com controle da inflação, queda de juros, que vai ajudar o setor público e o setor privado.
Com informações do Correio Braziliense
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