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Extrema pobreza: R$ 85 por mês dão sobrevida a 260 mil brasilienses

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Em um barraco de madeira sobre o chão batido de terra na Chácara Santa Luzia, na Estrutural, uma carroceira de 29 anos não tem vergonha de falar da fome. Ela, que já teve de comer do lixo, já ingeriu comida estragada e sentiu vontade de pegar um grão de arroz no chão para vencer o dia, agora tenta evitar que os filhos tenham a mesma experiência de extrema pobreza. O número de pessoas que custam a colocar comida no prato é desconhecido no DF, mas mais de 260 mil vivem com apenas R$ 85 mensais.

Na casa de Liliane Vieira Cândido, as crianças já decoraram o cardápio: arroz e feijão, todos os dias. O ovo só é posto na mesa em dias melhores. Carne, então, é luxo. Com reciclagem, a carroceira e o marido têm renda que não passa dos R$ 870 por mês e eles precisam sustentar cinco filhos. Neste mês a situação piora: os R$ 370 que recebiam de programas sociais foram cortados após os filhos ficarem uma semana longe da escola.

Ponto de vista

“É pouco, mas vai fazer falta. O governo tinha que pensar nas crianças”, desabafa. O caso aconteceu quando eles ficaram uma semana sem energia e água. “Eu não ia mandar as crianças sujas, doentes, porque eu sei o problema que isso pode dar no Conselho Tutelar”, alega. Agora, ela tenta descobrir como colocar comida em casa com recurso ainda menor.

A simplicidade nunca foi motivo para desânimo. Ela, que mora há 20 anos na Estrutural, diz que enquanto tiver forças lutará para que os filhos possam ter uma vida digna. Quando a situação fica mais crítica, Liliane busca ajuda em igrejas e em serviços públicos.

“Eu sei o que é fome, porque já passei por isso. Eu não posso dar do bom e do melhor, mas com o que temos vamos vivendo, apesar das dificuldades, somos felizes. Se não tem arroz, vai só o feijão. Se não tem feijão, vai arroz puro. E assim vai indo”, declara.

Menos que um bujão de gás

Não existe uma estimativa de quantas pessoas vivem assombradas pela fome em plena capital do Brasil, como a família de Liliane na Estrutural. Sabe-se que cerca de 260 mil têm renda mensal comprovada de até R$ 85, que sequer dá para comprar um botijão de gás e, em condições de extrema pobreza, são beneficiárias de programas assistenciais de transferência de renda.

Segundo a Secretaria de Trabalho, Desenvolvimento Social, Mulheres, Igualdade Racial e Direitos Humanos, 65 mil famílias recebem o benefício mensal. Com o Bolsa Família e o DF Sem Miséria, elas ganham, em média, R$ 132 para complementar a renda. Juntos, os programas tentam garantir uma renda per capita de R$ 140.

Desde o início do ano, mais de 13 mil famílias do DF foram inseridas no Cadastro Único para Programas Sociais. Hoje, 166 mil delas recebem dinheiro do governo por situação de vulnerabilidade, o que representa 664 mil habitantes.

Segundo levantamento de 2013 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), o índice distrital de insegurança alimentar estava abaixo da média nacional e da região Centro-Oeste. A situação vai desde preocupação com uma hipotética falta de alimento à situação real de passar fome.

Condição precária no centro do poder

Reduto das principais decisões políticas e jurídicas do País, o DF tem “bolsões de muita pobreza”, como afirma José Ivan Mayer de Aquino. Professor aposentado e especialista de Políticas e Gestão Governamental, ele coordena o comitê distrital da Ação da Cidadania contra a Fome, a Miséria e pela Vida, uma das ONGs que trabalham pela erradicação da fome no País.

Após anos focada em arrecadação de literatura, a instituição teve de voltar a distribuir alimentos. Sol Nascente, Estrutural e assentamentos estão entre os pontos apontados como vulneráveis. “Voltamos a arrecadar alimentação pela necessidade, pela diminuição da renda média das pessoas ocupadas, pelo aumento do desemprego e redução dos recursos orçamentários que enxergam as pessoas mais pobres”, diz.

Bola de neve

A fome não está sozinha. Ela vem com falta de oportunidade, baixa escolaridade e desemprego. Segundo dados da Companhia de Planejamento do DF (Codeplan), as mais altas taxas de desocupação se concentram no grupo de regiões administrativas de baixa renda, como Estrutural, Fercal e Itapoã. Esses locais também concentram pobreza e fome.

Rosimeire da Cunha Leite, 46 anos, não quer benefício, quer trabalho. Há dois anos de volta à capital após seis tentando a vida em São Paulo, ela já distribuiu currículo em diversos setores. “Eu sei de tudo um pouco. O que aparecer eu topo”, resume. Enquanto isso, a comida para as sete pessoas de casa vem de doações. “Minha irmã, que é frentista, me dá. São R$ 1,2 mil para a minha casa e a dela. Não passamos fome, mas é complicado depender dos outros”, pondera.

Ao receber a equipe em casa, ela tinha um pacote de arroz e feijão para o mês. “A despensa vai ficando vazia. O desespero bate pois tenho dois netos que cuido”, lamenta.

 

Com informações do Jornal de Brasília.

 

 

Jornalista

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